
O Seminário de Asssistência Técnica do CAU/RJ reuniu diversos relatos de experiências práticas sobre o tema. A professora da Universidade Federal Fluminense Regina Bienestein compartilhou um pouco de sua vivência no Núcleo de Estudos e Projetos Habitacionais e Urbanos da UFF (Nephu), apresentando trabalhos na Favela do Gato em Niterói, no projeto Mama África, que envolveu a reforma de um casarão ocupado e, mais recentemente, o caso da Vila Autódromo, em Jacarepaguá. Para a professora, a regulação fundiária está associada à regulação urbanística. “A assistência técnica deve ser defendida como parte do direito à moradia e à cidade. É uma atividade que não se sustenta sozinha. É preciso considerar que muitos desses lugares estão em áreas de risco, que é preciso uma articulação com o sistema viário, além de ajustes no traçado urbanístico”.
Outra professora convidada, dessa vez da Universidade Federal da Bahia, foi Angela Gordilho, cofundadora do Lab-Habitar na instituição. Ela trouxe para a discussão o exemplo da “residência” profissional em arquitetura e urbanismo e engenharia. “As universidades têm privilegiado a pesquisa e o ensino, ficando distantes das questões da cidade. No final do ano letivo, projetos e maquetes vão para o lixo. Em um país com a necessidade básica de direito à moradia e à cidade, a residência técnica é um retorno que a universidade pode dar para a sociedade”, ponderou. O programa de especialização desenvolvido pela UFBA dura de 14 a 16 meses, com disciplinas ministradas por 46 professores. A cada dois anos, 25 profissionais se formam, apresentando projetos preliminares para comunidades cadastradas. Os projetos são doados, mas, posteriormente, o profissional pode prestar assessoria técnica paga pelos moradores. Gordilho informou ainda que a universidade está desenvolvendo um acervo de referência com projetos de assistência técnica que deve ser concluído no próximo ano.
Outra experiência de capacitação apresentada no seminário foi o PAP. Os arquitetos e urbanistas Maurício Campbell e Laura Elza Gomes, que atuaram como orientadores, e Fernanda Bizzo e Helga Santos, então residentes, contribuíram para o debate compartilhando suas lembranças. “O PAP foi um programa feito pela prefeitura com apoio da União Europeia. Nosso sonho é que ele se tornasse uma política pública, o que não aconteceu”, lamentou Laura Elza, que também é professora da UFF. “Ninguém sai da faculdade sabendo fazer orçamento, conhecendo a fundo as patologias estruturais. O PAP era um programa de aperfeiçoamento profissional. Havia um curso de conforto ambiental adequado à realidade das comunidades, instalações prediais, metodologia para lidar com o morador. Por isso a importância da residência técnica”, complementou.
Helga Santos lembrou ainda que o programa estimulava o senso de responsabilidade nos jovens arquitetos com pouco mais de 20 anos. Já Fernanda Bizzo destacou a importância da assistência técnica considerando que muitas casas possuíam patologias construtivas que contribuíam para diminuir a vida útil das habitações e para a proliferação de doenças.

O PAPEL DOS PREFEITOS
A atuação da prefeitura do Rio foi representada pela gerente de regulação urbanística da Secretaria Municipal de Urbanismo, Infraestrutura e Habitação, Tânia Castro, que falou sobre o Programa de Orientação Urbanística e Social (Pouso). O programa funcionou até 2009, com o objetivo de promover a consolidação dos novos bairros, criados com o Favela Bairro. Tânia Castro também explicou um pouco do funcionamento do projeto arquiteto social, em que profissionais autônomos são pagos pelos moradores para prestação de orientação técnico-construtiva. “Nossa expectativa é a retomada do trabalho do Pouso em sua essência, com um caráter mais orientador do que fiscalizador”, disse.
A importância da parceria com a prefeitura foi ressaltada pela arquiteta e urbanista Tatiana Terry, sócia do escritório ArquiTraço Projetos, com expertise em Programas de Urbanização de Favelas. “Não podemos pensar assistência técnica de forma isolada. Não podemos abrir mão da participação da prefeitura. Quando vamos intervir em um local, precisamos saber qual a mancha da área de risco, em qual casa podemos intervir, e a prefeitura tem esses dados, por mais defasados que eles possam estar”, pontuou. Tatiana afirmou que o momento de crise econômica no país não pode ser usado como argumento para não discutir habitação. “O trabalho de Carlos Nelson em Brás de Pina foi feito na época mais improvável”, lembrou.
A coordenadora do Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM), Maria de Lurdes Lopes Fonseca, encerrou o seminário com alguns conselhos para os arquitetos e urbanistas que querem trabalhar com assistência técnica. “Considere os moradores como parte do processo. Lembrem-se que somos nós que teremos que viver com o resultado do trabalho de vocês. A assistência técnica pode ser tratada do ponto de vista do mercado, mas nós a entendemos como nosso direito de ter uma moradia saudável”, afirmou Lurdinha.

OFICINAS
No dia seguinte ao seminário, sábado (08/04), conselheiros, palestrantes e participantes do evento se reuniram na sede do CAU/RJ para as oficinas sobre o tema. O resultado do trabalho vai ser utilizado pelo CAU/RJ, após passar pelas Comissões de Exercício Profissional e de Ensino e Formação, para ajudar a formatar uma proposta para o uso da verba de 2% da receita em projeto de assistência técnica, conforme a resolução do CAU/BR.
Foram formados dois grupos. Um discutiu os temas “Contexto e Habitação no Brasil e Assistência Técnica”; “Panorama de Assistência Técnica no Brasil” e “Experiências Cariocas: Programas Oficiais e Autogestão”. Já os do grupo 2 foram “Residência Profissional e Experiências em Universidades” e “Aperfeiçoamento Profissional e Capacitação”. Ao final dos trabalhos, os grupos se reuniram e leram suas conclusões. Um relatório está sendo produzido para ser encaminhado às comissões.
Estiveram presentes, além do presidente do CAU/RJ, Jerônimo de Moraes Neto, os conselheiros Marcela Abla (coordenadora do seminário); Vera Hazan (coordenadora de um dos grupos); Claudia Baima, Júlio Bentes (coordenador da Comissão de Ensino e Formação); Augusto Cesar Alves (coordenador da Comissão de Exercício Profissional e de um dos grupos).
Veja aqui como foi a primeira parte do evento.
Texto: Ascom CAU/RJ (Marta Valim)
Fotos: Ascom CAU/RJ (Ricardo Lopes)
Publicado em 12/04/2017