Em função de novas informações, volto ao tema da ciclovia Leblon – São Conrado, que no último dia 21 de abril de 2016 teve um sério acidente provocado por uma ressaca na costa da cidade do Rio de Janeiro, que causou a morte de duas pessoas. No primeiro texto da série, apontei que o descuido com a fase de projeto era claro, pois a presença de uma obra notável do patrimônio da cidade do Rio de Janeiro – o viaduto Rei Alberto, datado de 1920, da abertura da Avenida Niemyer – não havia sido considerado pelo desenho. Argumentei também, que a forma de contratação das obras públicas no Brasil tendem com o modelo da Contratação Integrada (CI) e do Regime Diferenciado de Contratação (RDC) a não dar a devida autonomia a fase de projeto, tratando-o de forma expedita e rasteira, sem o devido aprofundamento.
Agora novas informações corroboram àquelas primeiras impressões. Em primeiro lugar, o empreiteiro e o gerenciador das obras eram o mesmo agente, o consórcio Concremat-Concrejato gerenciava e construia a obra, o que claramente nega o princípio da fiscalização ou controle cruzado tirando ou reduzindo a autonomia da fase de projeto. Em segundo lugar, a prefeitura desenvolveu apenas um projeto básico, que segundo a lei 8666/93 corresponde a um projeto sem detalhamento, capaz de gerar apenas os quantitativos e o orçamento da obra, necessários para a promoção da licitação da execução, o que também denota e enfatiza a falta de apuro e esmero. Em terceiro lugar, esse projeto básico envolveu apenas as disciplinas de estrutura e de fundações, não tendo qualquer consultoria de arquitetura, de urbanismo ou de paisagismo, disciplinas que certamente sensibilizariam o desenho para a presença do viaduto Rei Alberto, e teriam pela interdisciplinariedade trazido outros olhares e complexidades ao projeto. Em quarto lugar, a seção tipo da laje da ciclovia muda exatamente no trecho em que havia o registro de ressacas recorrentes, de uma seção com duas vigas junto aos bordos, se passa para apenas uma viga central, portanto com desenvolvimento de abas mais generosas, o que certamente potencializou o esforço de baixo para cima da onda.
Há ainda um outro aspecto, que foi noticiado nos primeiros momentos, mas que a mídia abandonou como não sendo relevante, o fato da troca do responsável técnico da obra nas últimas fases do cronograma de implantação. Enfim, estamos diante de um caso grave, onde as evidências sobre a maneira da materialização do projeto, cada vez mais nos mostra o desdém com que vem sendo tratado o projeto e o planejamento em nossa sociedade.
Foi gravado nesta quarta-feira, dia 27 de abril de 2016, entrevista com a CBN-Rio sobre o assunto. Confira a entrevista abaixo:
FONTE: ARQUITETURA, CIDADE E PROJETO
VERSÃO DA CONSTRUTORA – A proposito desse artigo a empreiteira da obra enviou ao CAU/BR em 28/04 a seguinte nota:
A Concremat Engenharia não gerenciou ou fiscalizou a obra. Sobre os contratos celebrados entre a Concremat Engenharia e a Secretaria Municipal de Obras (SMO-RJ), a empresa esclarece:
– A empresa possui contrato com SMO-RJ, cujo objeto trata do apoio administrativo às outras obras da prefeitura municipal que recebem verbas do BNDES.
– Como já divulgado anteriormente, tal serviço não possui caráter de fiscalização ou coordenação e é executado a partir de dados secundários – já levantados por outros órgãos e/ou empresas – e não afere qualidade e nem aprova medições das empresas responsáveis por estas obras.
– A existência desses contratos já foi supervisionada e aprovada pelas autoridades competentes e não caracteriza, portanto, conflito de interesse.
Em relação ao responsáveis técnicos da obra:
Os engenheiros Marcelo José Ferreira Carvalho e Hércules Bruno Neto, inicialmente responsáveis pela obra, deixaram a empresa e foram substituídos.
Publicado e alterado em 28/04/2016