Assistência Técnica

Arquitetura social: todos têm direito à habitação

Se a essência da arquitetura consiste em pensar e projetar espaços para as atividades e necessidades humanas, é importante que arquitetos e urbanistas desenvolvam uma visão plural e aberta das diferentes realidades que se pode encontrar em termos de habitação. Um projeto arquitetônico bem feito, com cuidado e respeito a aspectos técnicos, à funcionalidade e aos usos que o ambiente terá, pode interferir de maneira decisiva no bem-estar e qualidade de vida de uma família.

 

Vivendo num país que tem a desigualdade social como característica marcante, é indispensável tomar consciência deste ponto de partida. Muitas vezes, não se conta sequer com questões básicas como saneamento, segurança estrutural e de instalação elétrica, consequências do alto índice de pessoas que constroem sem o auxílio técnico de um arquiteto ou engenheiro.

 

A contribuição dos arquitetos com a luta pela habitação

 

Em 2016, o Prêmio Pritzker contemplou o arquiteto e urbanista chileno Alejandro Aravena, responsável por projetos inovadores na área da habitação social. Entre eles, estão a habitação social Quinta Monroy, onde criou e aplicou o conceito de casa semi-concluída, e seu plano de reconstrução de uma cidade chilena – atingida pelo terremoto seguido de tsunami em 2010 – com foco na resiliência. Um valor importante que Aravena traz é o do envolvimento da comunidade com as mudanças propostas pelo arquiteto. Afinal, será ela a principal afetada pelas transformações daquele espaço.

 

Habitação social Quinta Monroy. Casas semi-concluídas com orçamento público, completadas pelos moradores. Foto: Elemental
Habitação social Quinta Monroy. Casas semi-concluídas com orçamento público, completadas pelos moradores. Foto: Elemental

 

No Brasil, a arquiteta e urbanista Alis Josefides desempenha papel importante ao promover a arquitetura de interesse social. Nascida no Uruguai, Alis veio morar no Rio Grande do Sul aos 13 anos e formou-se na Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Atualmente, trabalha como arquiteta autônoma na cidade de São Paulo.

 

A atuação profissional da arquiteta concentrou-se por muito tempo na área pública, com projetos e execução de obras em áreas de favela. Alis Josefides, desde a época de estudante, já dedicava seu tempo à militância pela habitação popular. Na vida acadêmica, também empreendeu esforços para a fundação da Federação Nacional dos Estudantes de Arquitetura (FENEA). Para a arquiteta, o primeiro desafio é a mudança da visão da sociedade em relação à atuação profissional do arquiteto e urbanista. “Arquiteto é visto como artigo de luxo. A falta de entendimento da população em geral, sobre o que o arquiteto faz, é cultural. A quebra desse paradigma somente se dará com a aproximação do arquiteto e urbanista em todas as camadas da sociedade”, afirma. Ela ressalta que a função social do arquiteto vai além da construção de casas, mas abrange toda a noção de urbanismo inclusivo, que conecte o cidadão com o lugar onde vive e proporcione acesso às estruturas de comércio, cultura e lazer.

 

O papel das políticas públicas

 

Um elemento importante para que a atuação social do arquiteto se desenvolva de maneira efetiva é a organização do poder público para dar conta das demandas crescentes de estruturação urbana com o aumento populacional nas cidades. Conforme dados do IBGE de 2010, quase 85% da população brasileira habita áreas urbanas. Alis Josefides destaca que este alto índice gera demandas específicas que devem ser abraçadas pelas autoridades. A delimitação e regulamentação de Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS) – assentamentos já existentes que passam a ter condições urbanísticas especiais para a urbanização e regularização fundiária, garantindo a posse de terra aos moradores – é desafio atual. “A urbanização dessas regiões deve ser voltada para as classes trabalhadoras, promovendo moradias acessíveis financeiramente, e dotadas de todos os equipamentos de infraestrutura urbana, além de todos os serviços inerentes ao atendimento das necessidades dessa população, como escolas, creches, unidades de saúde, mobilidade urbana”, explica.

 

Para que as políticas públicas possam dar conta das demandas relativas à urbanização e habitação, é essencial a presença e atuação específica dos arquitetos e urbanistas nas prefeituras. “A escassez de profissionais arquitetos e urbanistas em muitas das administrações públicas resulta na precarização das políticas urbanas e habitacionais”, pontua a arquiteta. O estímulo ao desenvolvimento de uma carreira na esfera pública e da busca por espaço para o arquiteto nestes contextos, portanto, também é uma forma de batalhar pela causa da habitação.

 

Arquiteta e urbanista Alis Josefides. Foto: Arquivo Pessoal
Arquiteta e urbanista Alis Josefides. Foto: Arquivo Pessoal

 

A desmarginalização das periferias

 

Além da funcionalidade dos espaços projetados por arquitetos e urbanistas com atuação voltada para o interesse social, é essencial que se tenha, também, uma visão das necessidades de sociabilidade, lazer e cultura da população. Criando espaços de convívio, situando estruturas e projetos que coloquem a comunidade em contato direto e proporcionem o acesso a bens culturais, investe-se num projeto completo de humanização daquela população. “Disponibilizar espaços onde a população menos favorecida tenha acesso a projetos e atividades de cultura, esporte e lazer, de modo integrado, contribui para a formação individual e coletiva da comunidade, de modo a desenvolver sua cidadania”, afirma a arquiteta Alis Josefides.

 

É a partir do desenvolvimento desta cidadania que se contribui, também, com a formação intelectual e cultural, com a redução do sentimento de marginalidade que muitas vezes estas pessoas carregam, por serem constantemente negligenciadas pela sociedade e pelo poder público, e com a diminuição da violência urbana.

 

A lei de Assistência Técnica

 

No sentido de proporcionar o acesso das camadas menos privilegiadas da população aos serviços técnicos de engenharia e arquitetura e de regularização fundiária, a lei 11.888, de 2008, possibilita o acesso gratuito a estes recursos. Famílias com renda de até três salários mínimos têm direito ao benefício. Para Alis Josefides, a lei traz um avanço importante, mas há desafios maiores pela frente. “A busca de como efetivar esse direito é o desafio”, afirma a profissional.

 

Um dos valores a se ressaltar quando falamos em arquitetura de interesse social é o contato do arquiteto e urbanista com a população em questão. Só a partir desta interação, o profissional pode compreender, enxergando de perto, as particularidades do cotidiano, do convívio e funcionamento daquela casa e daquela comunidade.

 

O Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU/RS) está com edital de chamada pública aberto para ações de Assistência Técnica para Habitação de Interesse Social. Acesse o edital aqui.

 

Fonte: CAU/RS

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