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Artigo: Falta dinheiro?

O prefeito do Rio diz que a Olimpíada é uma oportunidade perdida pelo país. Às vésperas dos Jogos, o governador declara estado de calamidade em pleno sol. Onde ficarão na Abertura as autoridades federais, qual que sai, qual que fica?

 

Estarão os políticos à beira de um ataque de nervos? É caso para Pedro Almodóvar? Não obstante, somos esperançosos: a Olimpíada será um sucesso, e a cidade estará vibrante e receptiva. (Rezamos os crentes e torcemos os dedos os demais.)

 

Contudo, vencida a etapa, desanuviado o cenário nacional, precisaremos refletir sobre novos rumos. Já não digo os do país, cuja decifração é troppo para vis mortais, mas os meros rumos do Rio. Há 56 anos da saída da capital, há 40 da fusão, é tempo de uma revisão. O modelo que nos trouxe até aqui esgotou.

 

A insolvência do governo surpreende porque o Rio de Janeiro é estado rico. Entre os estados brasileiros, é o mais urbano e de maior densidade demográfica, de maior “densidade econômica” (relação PIB/território) e maior “densidade orçamentária” (tem o dobro de orçamento que São Paulo por território a cuidar: R$ 1,8 milhão/km2, no RJ; e R$ 0,8 milhão/km2, em SP, segundo dados de 2015.)

 

Ora, se o RJ é denso em população, em renda e em orçamento, por que indicadores relacionados ao território, como estradas, mobilidade, saneamento e segurança, são o que são?

 

Ademais, o Rio é uma das grandes cidades mundiais, e a concentração de 75% da população do estado na região metropolitana é excepcional fator potencializador de investimentos e infraestrutura.

 

As dificuldades do Estado do Rio não são coisa do outro mundo.

 

Veja-se a mobilidade olímpica. Segundo reportagem de Selma Schimdt, no GLOBO, a maior demanda de público será para os jogos que se realizarão no eixo olímpico Deodoro-Engenhão-Maracanã-Sambódromo. Esse eixo é servido pela Central do Brasil, concedida à Supervia, responsabilidade do governo do estado. Quanto foi investido nessa linha, que passa por 24 bairros? As 22 estações foram recuperadas? São acessíveis? Os usuários estão protegidos do sol e da chuva?

 

O estado gastou oito bilhões de reais na extensão da Linha 1 do metrô, Ipanema-Jardim Oceânico, de baixa participação olímpica e alto custo por passageiro. De fato, será um metrô singular: uma linha (e três nomes). Por um valor ínfimo do dispendido (talvez nem 10%), o estado traria à contemporaneidade o eixo da Central, com estações confortáveis e trens circulando em intervalos pequenos, tal metrô das grandes cidades. E, agora, o público olímpico e os moradores do Rio estariam mais bem atendidos.

 

Não se chora o leite derramado. Mas é preciso reconhecer que o Estado gasta mal, muito; e bem, pouco. Não tem serviços de planejamento compatíveis com sua responsabilidade.

 

Dizem os estudiosos que é indispensável um novo marco político e um amplo acordo social. Como se faz? Quem os propõe?

 

O mesmo governo que estendeu o pires, se quiser, tem tempo de prevenir outras calamidades. Quem acredita no valor da qualidade do espaço para o bem-estar das pessoas diria que o começo pode ser a constituição de estruturas permanentes de planejamento como função de Estado — tanto no âmbito estadual quanto dos municípios, de modo que estudos sérios possam embasar a ampla reflexão da sociedade e fundamentar investimentos futuros (que virão), sejam públicos ou concedidos. Custa pouco e poupa muito. É ainda uma boa medida para evitar o ataque de nervos de nossos políticos — e de nós todos.

 

O Rio de Janeiro pode ser uma unidade federada exemplar — ainda tem recursos econômicos e humanos para tanto. (Digo “ainda tem” porque eles se esgotam em ambiente desfavorável.) Porém, é preciso mudar de rumo.

 

Mas tudo isso pode ficar para depois. Agora, é torcer pela Olimpíada, pelo Rio e pelo Brasil. Bons Jogos!

 

Originalmente publicado em 16 de julho de 2016; O Globo

 

Publicado em 18/07/2016

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