Assistência Técnica

CAU Brasil e FNA defendem assistência técnica pública para moradias no UIA2021RIO

Hoje, 20 de julho, em evento realizado em parceria, o Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU Brasil) e a Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas (FNA) promoveram dentro do UIA2021RIO um debate sobre o caminho que tornou possível a existência e os primeiros treze anos da política de assistência técnica gratuita para reforma ou construção de moradia interesse social (Lei 11.888/2008).  

 

Na ocasião, o CAU Brasil lançou o “Manifesto em defesa de moradia digna para todos – Um projeto para o CAU e para o Brasil” (ver matéria específica). O evento foi realizado no palco Desafios com a Sociedade do UIA2021RIO e dividido em dois blocos: “Históricos e Desafios para uma Política Continuada” e  “Experiências e boas práticas”. 

 

A conselheira federal pelo Rio de Janeiro, Maíra Rocha, foi a mediadora da mesa inicial, que contou com a participação da coordenadora Adjunta da Comissão de Política Profissional do CAU Brasil, Cristina Barreiros;  do ex-presidente da FNA e ex-secretário de Planejamento Urbano de Porto Alegre, Newton Burmeister; e do Diretor Nacional de Cultura do Instituto de Arquitetos do Brasil – IAB, Luiz Eduardo Sarmento. 

 

 

 

Cada entidade  contribuiu de alguma forma para que a lei da ATHIS se tornasse realidade, uma história que começou nos anos 60. Em 1963, os arquitetos reconhecem a função social da propriedade como direito difuso da sociedade brasileira durante o Seminário do Hotel Quitandinha, no Rio de Janeiro. O evento histórico, promovido pelo IAB, trouxe grandes contribuições para a reformulação das diretrizes da política habitacional e o avanço da reforma urbana, processo interrompido com o Golpe Militar no ano seguinte.  

 

Nos anos 70, os arquitetos Clóvis Ilgenfritz e Newton Burmeister começaram a estimular o debate sobre uma lei que resguardasse o direito à moradia para a população de baixa renda. “Já fazia dez anos da ditadura militar e tínhamos outros dez anos à frente. Mas nós não sabíamos e não impedia o nosso exercício profissional nem a nossa preocupação com o contexto social”, recorda Burmeister.  

 

 

Coordenadora da Comissão de Política Profissional (CPP) do CAU Brasil, a conselheira federal pelo estado de Rondônia, Cristina Barreiros, falou sobre os compromissos expressos pela autarquia no videomanifesto.  Para a conselheira, a CPP, que tem a função regimental de tratar dos temas ligados à ATHIS, tem um papel estratégico na comunicação com os profissionais e a sociedade e vem se dedicando a este exercício desde 2015. Numa fase inicial, as ações do CAU respondiam à necessidade de reconhecer a pauta e desenvolver instrumentos para a gestão.

 

Como resultado, foi possível implementar medidas importantes, como a destinação de 2% de recursos do orçamento anual do CAU para ações de ATHIS e a instituição do RRT Social para facilitar o registro de projetos habitacionais. A partir deste ano, a nova gestão dá um passo à frente na popularização da lei da ATHIS com a campanha Mais Arquitetos. “Além do déficit habitacional, temos um índice enorme de moradias inadequadas e é nossa missão divulgar de forma massiva junto à sociedade as iniciativas de arquitetura social”, afirmou a conselheira.

Outra medida apontada pela arquiteta como fundamental para que a ATHIS se torne uma política efetiva é o estímulo aos arquitetos e estudantes de arquitetura para a atuação neste campo. “A nossa profissão é plural e em todos os caminhos a gente pode produzir boa arquitetura e melhorar a vida das pessoas”, disse a conselheira.

 

As principais contribuições do IAB para o avanço da ATHIS foram elencadas pelo arquiteto Luiz Eduardo Sarmento durante o debate. As conquistas legais e institucionais viabilizaram experiências diversificadas pelo país. Entre elas, a da Companhia de Desenvolvimento Habitacional do Distrito Federal (CODHAB/DF), onde Sarmento teve a oportunidade de atuar. Conduzida pelo arquiteto Gilson Paranhos, outro nome relevante para a história contemporânea da ATHIS, a política habitacional levada a cabo pela Codhab instalou postos de atendimento pela cidade, na mesma lógica do SUS, como defendia Clóvis. “Foi muito difícil, a gente teve que inventar muita coisa, mas sempre pudemos contar com estas grandes figuras que estavam pensando a política desde a década de setenta e também com as publicações que já existiam sobre o tema”, contou o arquiteto.  

 

 

O arquiteto destacou ainda a atuação conjunta com a Federação Nacional dos Arquitetos (FNA). “A união das entidades e até criação do CAU foram fundamentais para formular, divulgar e criar um campo para permitir a atuação social do arquiteto e urbanista”, em contraposição ao estigma elitista associado à profissão. “Na ATHIS, o arquiteto exerce uma advocacia das comunidades mais pobres e mostra que estas comunidades podem ser qualificadas e não precisam ser removidas. Existe muita sabedoria urbanística ali. Com um pouco de recurso e inteligência a gente consegue transformar os espaços”, afirmou. 

 

 

Provocados pela conselheira Maíra Rocha, os convidados também falaram sobre os desafios para que a política de ATHIS ganhe raízes e capilaridade no país. A conselheira Cristina apontou a mobilização dos arquitetos como um destes desafios e relatou as ações que vem sendo promovidas pelo CAU Brasil, como a campanha Mais Arquitetos e o trabalho em rede com as organizações representativas da categoria. A divulgação dos exemplos de ATHIS e promoção de iniciativas capazes de visibilizar o potencial transformador dos projetos de habitação popular para a vida das pessoas foi o caminho apontado por Luiz Sarmento para sensibilizar os gestores públicos. Newton Burmeister concorda. Para o decano, é preciso criar um circuito de experiências reconhecidas em ATHIS pelo Brasil capaz de oferecer um volume de amostras de soluções para habitação e criar uma cultura de reconhecimento do arquiteto nas comunidades. Burmeister também sublinhou a necessidade de garantia da política e de recursos nos municípios, territórios onde a demanda se materializa. 

 

Na opinião dos convidados, a lei não requer revisão neste momento, mas oportunidades de implementação de todas as possibilidades que ela prevê. “A jornada é longa mas a gente está num bom caminho neste campo desafiador que é a assistência técnica para habitação de interesse social. Eu me conforto muito em ver as novas gerações engajadas neste processo”, afirmou Newton Burmeister. 

 

EXPERIÊNCIAS E BOAS PRÁTICAS

O segundo bloco da live ofereceu uma vitrine de experiências exitosas em que a Assistência Técnica ofereceu base para solução de problemas de moradia a partir de diferentes arranjos. O vice-presidente da FNA Ormy Hütner Jr. recebeu a Diretora Executiva Nacional da ONG Habitat para a Humanidade Brasil, Socorro Leite; a professora do Departamento de Urbanismo da Faculdade de Arquitetura da UFRGS e Conselheira Superior do IAB-RS, Clarice de Oliveira; a presidente do Sindicato dos Arquitetos do Mato Grosso do Sul – SINDARQ/MS, Ivanete Carpes Ramos; e a arquiteta e urbanista Patrícia Oliveira, responsável pelo projeto Casa da Lala, em Manguinhos – RJ. 

 

Antes mesmo da Lei da ATHIS, o Sindicato dos Arquitetos do Mato Grosso do Sul  (SINDARQ/MS) já promovia e respaldava projetos de assistência técnica em parceria com o poder público e com o Movimento Nacional de Luta pela Moradia. A presidente Ivanete Carpes Ramos relatou os projetos e as diferentes parcerias institucionais que permitiram ao sindicato viabilizar a redução sobre o déficit habitacional no estado.  

 

 

Em seguida, a professora do Departamento de Urbanismo da Faculdade de Arquitetura da UFRGS e Conselheira Superior do IAB-RS, Clarice Mizockzy, trouxe uma experiência de ATHIS aplicada ao planejamento urbano. O projeto Planos Populares de Ação Regional ofereceu suporte técnico a planejadores do espaço urbano em cinco regiões de Porto Alegre. Promovido pelo IAB-RS com recursos de edital promovido pelo CAU/RS, o projeto foi realizado em parceria com a UFRGS.   

 

A terceira experiência apresentada durante a mesa foi o projeto Casa da Lala, em Manguinhos – RJ, atualmente em fase de execução. Quando idealizou o projeto da residência unifamiliar em 2017 para atender uma amiga em situação de vulnerabilidade, a arquiteta Patrícia Oliveira não sabia que estava exercendo ATHIS. “Penso que falta divulgação desta lei e escritórios modelo de ATHIS nas faculdades”, relatou.  

 

A promoção de moradias adequadas é o foco da atuação da Habitat para a Humanidade Brasil, autora da última experiência apresentada durante o encontro. A Diretora Executiva Nacional Socorro Leite fez um breve relato das diversas ações desenvolvidas pela ong nos últimos 29 anos, desde projetos do Programa Minha Casa Minha Vida – Entidades até outras iniciativas a partir de diferentes fontes de captação de recursos para viabilizar melhorias habitacionais em diversos estados brasileiros. 

 

As convidadas também discutiram os principais entraves para que a ATHIS se torne uma política de ampla aderência, como a escassez de recursos. “Quando a gente fala em defesa da ATHIS, está defendendo uma política nacional de habitação. Este contexto de desmonte das políticas públicas no nosso país impacta nas possibilidades de atender a população de baixa renda com moradia adequada”, afirmou Socorro Leite, defendendo o fortalecimento de políticas públicas para habitação.  

 

O reconhecimento da ATHIS como campo de trabalho e a formação de profissionais preparados para atuar na área foi outro desafio apontado. O SINDARQ/MS vem se dedicando à capacitação dos profissionais interessados em ingressar na área, de acordo com a presidente Ivanete Carpes Ramos. “As pessoas de baixa renda querem muito morar bem, e não só morar. Se voltarmos nossa atenção pra este público. Se cada arquiteto fizer um projeto social, já ajuda bastante”, afirmou. 

 

Patrícia Oliveira, que se intitula “favelada arquiteta”, invocou a empatia dos colegas e  incentivou os arquitetos a ingressarem no vasto campo de trabalho da ATHIS. “Além de uma ação humanitária, é também uma uma amor ao próximo”, afirmou. 

 

Clarice Mizoczky destacou a ATHIS como ação estratégica para proteção social das mulheres, que são maioria das chefes de família nas residências com inadequações no Brasil. “É um trabalho muito importante para o país, as mulheres em situação de vulnerabilidade social precisam desse suporte pra ter uma casa digna. Temos pela frente um trabalho longo e gratificante”, disse a arquiteta. 

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