O abandono do Centro Histórico de Salvador foi debatido pela Câmara dos Deputados em audiência pública realizada no dia 24 de setembro. No final de junho, o Conselho de Arquitetura e Urbanismo da Bahia (CAU/BA), o Instituto de Arquitetos do Brasil – Departamento da Bahia (IAB-BA) e o Sindicato dos Arquitetos e Urbanistas do Estado da Bahia (Sinarq-BA) denunciaram ao Centro do Patrimônio Mundial da Unesco, em Paris, o estado de ruína das construções históricas, consideradas Patrimônio da Humanidade em 1985, solicitando a inclusão da região na lista do Patrimônio Mundial em Perigo. Saiba mais aqui.
Participaram da audiência o presidente do CAU/BA, Guivaldo D’Alexandria; o conselheiro estadual do CAU/BA, Paulo Ormindo; a presidente do IAB/BA, Solange Souza Araújo; o representante da IDEAS Assessoria Popular, advogado Wagner Moreira; e o presidente substituto do Iphan, Andrey Rosenthal Schlee, também arquiteto. O evento foi uma iniciativa da deputada Alice Portugal (PCdoB-BA), que solicitou o debate em maio.
Neste ano, 32 prédios históricos já tiveram que ser demolidos pela falta de preservação. Segundo o arquiteto Paulo Ormindo, existem ainda outros 1.500 sobrados escorados ou desocupadas no Centro Histórico que correm o mesmo risco. Já houve 36 demolições.”É preciso uma ação emergencial para evitar esta catástrofe cultura e política da imagem da Bahia e do Brasil”, afirmou. “A situação ao que chegou o nosso centro histórico se deve a retira de suas funções centrais, ao seu esvaziamento habitacional e a marginalização viária. As ações realizadas nos últimos 40 anos visaram apenas a consolidação edilícia sem compreender que seu problema é urbanístico e social”, completou.
Para a presidente do IAB/BA, Solange Souza Araújo, as perdas decorrentes das demolições são irreparáveis. “Na medida em que começam a fragmentar esta composição morfológica da paisagem de Salvador, abrem-se lacunas, e, provavelmente, nesses espaços serão incluídos edifícios que não têm nada a ver com aquele contexto e desenho”. A entidade defende um Centro Histórico que não seja um enclave e que atenda a todas as categorias sociais e econômicas. Solange afirmou ainda que no parecer técnico apresentado Iphan não havia indicação de demolição dos imóveis na região.
O presidente substituto do Iphan, Andrey Rosenthal Schlee, informou na audiência que as demolições foram autorizadas pela instituição após a análise do laudo técnico emitido pela Defesa Civil. A deputada Alice Portugal lembrou que, de acordo com a Lei Nº 3289/83, nenhuma intervenção de área de proteção rigorosa pode ser feita sem um parecer conjunto do Iphan, IPAC e Prefeitura Municipal. “Isso significa que as demolições na Ladeira da Montanha, além de precipitadas, foram ilegais. Não podemos continuar com o Iphan sendo conivente com atitudes como essa. O instituto da Bahia precisa se colocar diante da ilegalidade dessas demolições.” Andrey Schlee, por sua vez, chamou atenção para a responsabilidade da Prefeitura de Salvador na organização urbanística da cidade. “Onde está o plano urbanístico para essas áreas, onde está o plano diretor. É preciso que cada um assuma seu papel constitucional, e o Iphan tem feito isso”, afirmou. Ele sugeriu que o orçamento da União contemple ações para a preservação do patrimônio histórico e artístico do Brasil.
O advogado Wagner Moreira, representante da IDEAS Assessoria Popular, destacou a importância de intervenções conjuntas do poder público para tentar reduzir os impactos das demolições no Centro Antigo, principalmente no que diz respeito aos moradores do local. “Falamos muito dos casarões que estão sendo derrubados, mas embaixo dos escombros há sangue negro sendo derramado. O Centro Antigo sangra, e existem muitas famílias que estão sem casa, sem alojamento, sem qualquer tipo de assistência do poder público. Isso precisa ganhar visibilidade.”
Os deputados presentes apoiaram a inciativa das entidades de Arquitetura e Urbanismo e se comprometeram a buscar soluções para o problema. A deputada Alice Portugal sugeriu uma grande mobilização nacional em torno do tema. “Estamos colocando nosso mandato nessa busca para dar amparo à preservação do patrimônio, com mais busca de recursos e com nosso envolvimento. Vamos alertar todas as instituições envolvidas”, disse.
O presidente do CAU/BA, Guivaldo D’Alexandria, agradeceu o apoio dos deputados. “Acho que aqui começa a se firmar um pacto, um compromisso e isso transcende bandeiras políticas, transcende ideologias, transcende raças”, disse. “Acho que o que está em jogo é o patrimônio de uma nação e isso tem que transcender políticas de governo, precisa entender com clareza como política de estado. Ou seja, patrimônio, e isso envolve em suas diversas manifestações, precisa-se entender como expressão de cultura de um povo”.
Em votação na 46ª Reunião Plenária Ordinária, que ocorria na mesma tarde em Brasília, o CAU/BR apoiou a ação das entidades de Arquitetura e Urbanismo da Bahia. “Que isso seja mais uma alavanca para trabalhos similares que vêm sendo desenvolvidos em vários estados, nessa luta pela melhor qualidade da arquitetura e dos espaços públicos”, afirmou o presidente do CAU/BR, Haroldo Pinheiro.
Guivaldo D’Alexandria destacou que o CAU/BA pretende realizar um fórum em Salvador com a presença da Unesco. “O CAU também deve ser guardião do patrimônio que também pertence às futuras gerações”, disse o presidente do CAU/BA.
Publicado em 25/09/2015. Atualizado em 30/09/15,