O fomento na administração municipal de inovações a partir da cultura do compartilhamento e da solidariedade é o eixo da “Carta dos Cem Dias – Por um Pacto pelo Direito à Cidade” lançada pelo Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR), dirigida aos prefeitos que estão em meio ao quarto mês de seus mandatos.
O documento propõe uma aliança “pela qualidade e usufruto digno e democrático da cidade, baseado em instrumentos políticos de gestão pública transparentes e inclusivos”. O objetivo é promover um desenvolvimento urbano e territorial sustentável nas dimensões social, econômica e ambiental, como proposto na Nova Agenda Urbana definida na conferência HABITAT III das Nações Unidas realizada em 2016 em Quito, no Equador.

A Carta do CAU/BR reconhece a diversidade das cidades brasileiras, mas acentua que independentemente de tamanho ou perfil econômico, elas têm um problema comum: “são vítimas do desmantelamento do planejamento urbano ocorrido no Brasil nas últimas décadas nas três esferas administrativas”. Em oposição a esse cenário, o CAU/BR defende “uma agenda urbana transformadora do destino das cidades e dos cidadãos brasileiros”.
Para as metrópoles, a Carta sugere um avanço na implementação da Governança Interfederativa das Metrópoles, previsto no Estatuto da Metrópole, com compartilhamento de responsabilidades e ações entre Municípios e Estado em termos de organização, planejamento e execução de funções públicas de interesse comum. A Governança Interfederativa “não tira, ao contrário, amplia o poder político-administrativo dos prefeitos”, segundo o documento, além de garantir a conquista para os munícipes da cidadania metropolitana e outros ganhos. “O Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado (PDUI) facilitará ações como integração do transporte público intermunicipal, racionalização de serviços de saneamento básico, proteção ambiental e programas habitacionais articulados com mobilidade, infraestrutura e locais de trabalho”.
No extremo oposto, para as pequenas cidades, a Carta sugere “fomentar na administração municipal inovações a partir da cultura do compartilhamento e da solidariedade. Além da troca de informações sobre boas práticas, é preciso pensar em soluções para superar a fragilidade fiscal das pequenas cidades, como consórcios de gestão para custear a elaboração de planos e projetos que viabilizem o acesso a recursos orçamentários, financiamentos e inclusive programas subsidiados por organismos internacionais”.
A Carta é resultado do IV Seminário de Política Urbana e Ambiental-Desafios do Projeto Cidade realizado nos dias 4 e 5 de abril em Brasília sob o tema “A Gestão Urbana Inserida no Compromisso com a Nova Agenda Urbana”. O documento igualmente propõe a criação de redes de cidades integradas a outras redes da sociedade que possam contribuir com a informação e a divulgação de boas práticas de gestão visando a inclusão social, o crescimento econômico sustentado e a proteção do meio ambiente.
O documento aborda ainda a necessidade dos gestores públicos se envolverem com discussões no Congresso de matérias que afetam nossas cidades, como a Medida Provisória da Regularização Fundiária Urbana (759/2016), à revisão da Lei de Licitações (Projeto de Lei 6.814/2017) que podem comprometer o planejamento, a gestão e a qualidade dos espaços e equipamentos públicos dos municípios brasileiros. Pede também “um efetivo empenho do Governo Federal e das Prefeituras na aplicação da Lei de Assistência Técnica Pública e Gratuita para o projeto e a construção de habitações de interesse social (11.888/2008)”.
Veja abaixo a íntegra do documento e clique no link para baixar a versão pdf.
CARTA DOS CEM DIAS – POR UM PACTO PELO DIREITO À CIDADE
O insustentável modelo de crescimento que colapsou as cidades brasileiras representa um desafio enorme para os gestores municipais recém empossados. É a eles especialmente, reafirmando sua posição política na Sociedade, que o CAU/BR – Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil se dirige no marco de 100 dias de suas administrações.
Senhoras e Senhores Gestores das cidades brasileiras:
O Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil – CAU/BR, autarquia federal que reúne os 145 mil arquitetos e urbanistas na ativa no país, assumiu um compromisso perante as Nações Unidas para contribuir com a implementação no Brasil das diretrizes da Nova Agenda Urbana definida na conferência HABITAT III realizada em Quito, no Equador, em 2016. O objetivo é promover um desenvolvimento urbano e territorial sustentável nas dimensões social, econômica e ambiental. Ou, como diz o documento, um lugar onde “ninguém seja deixado para trás”.
Por meio desta Carta, o CAU propõe aos novos gestores municipais uma aliança por uma agenda urbana transformadora do destino das cidades e dos cidadãos brasileiros. Trazemos a proposta de um Pacto pelo Direito à Cidade.
Conforme dados da Confederação Nacional dos Municípios, 4.911 dos 5.568 municípios brasileiros (88,2%) possuem até 50 mil habitantes, com um orçamento anual médio de R$ 36 milhões. Apenas 17 municípios (0,3%) têm acima de um milhão de moradores e, na média, um orçamento anual de R$ 9,4 bilhões. Tal realidade diversa das cidades brasileiras, em termos de escala territorial e vida econômica, exige que as políticas públicas urbanas no país separem as questões específicas das metrópoles, das cidades médias e das cidades pequenas.
Um ponto, contudo, elas têm em comum: são vítimas do desmantelamento do planejamento urbano ocorrido no Brasil nas últimas décadas nas três esferas administrativas. Em oposição a esse cenário, o Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil defende um pacto pela qualidade e usufruto digno e democrático da cidade, baseado em instrumentos políticos de gestão pública transparentes e inclusivos.
O Pacto pelo Direito à Cidade é baseado em três grandes premissas expressas inicialmente na “Carta Aberta aos Candidatos a Prefeitos e Vereadores – Qual a cidade que precisamos? Um pacto pela qualidade das cidades”, divulgada em agosto de 2016: a governança, o planejamento urbano e o monitoramento cidadão.
O Brasil conta hoje com uma legislação urbanística avançada mas pouco conhecida e institucionalizada. Os gestores das cidades metropolitanas, médias ou pequenas devem assumir o compromisso político de implantar os instrumentos de planejamento que garantam a sustentabilidade de suas comunidades previstos no Estatuto da Cidade e no Estatuto da Metrópole.
A participação direta do cidadão na concepção do planejamento, nas consequentes discussões nas Câmaras Municipais e no acompanhamento de sua implementação materializa o princípio constitucional da função social da cidade.
Sob a ótica do momento, os participantes do IV Seminário de Política Urbana e Ambiental – “A Gestão Urbana Inserida no Compromisso com a Nova Agenda Urbana”, realizado pelo CAU/BR em Brasília nos dias 4 e 5 de abril de 2017, concluíram serem os seguintes os desafios mais importantes no processo de gestão urbana do país:
- A sensibilização do Congresso Nacional em relação à Medida Provisória da Regularização Fundiária Urbana (759/2016) e à revisão da Lei de Licitações (Projeto de Lei 6.814/2017) que podem comprometer o planejamento, a gestão e a qualidade dos espaços e equipamentos públicos dos municípios brasileiros;
- Um efetivo empenho do Governo Federal e das Prefeituras na aplicação da Lei de Assistência Técnica Pública e Gratuita para o projeto e a construção de habitações de interesse social (11.888/2008);
- Avançar na implementação da Governança Interfederativa das Metrópoles, previsto no Estatuto da Metrópole, com compartilhamento de responsabilidades e ações entre Municípios e Estado em termos de organização, planejamento e execução de funções públicas de interesse comum. A Governança Interfederativa, se construída como um modelo de gestão baseado não em um poder centralizado vertical, mas em acordos, concessões e decisões multilaterais, não tira, ao contrário, amplia o poder político-administrativo dos prefeitos. A Governança Interfederativa permitirá que os gestores urbanos conquistem para seus munícipes a cidadania metropolitana – o Direito à Metrópole – e inúmeros ganhos. O Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado (PDUI) facilitará ações como integração do transporte público intermunicipal, racionalização de serviços de saneamento básico, proteção ambiental e programas habitacionais articulados com mobilidade, infraestrutura e locais de trabalho;
- Fomentar na administração municipal inovações a partir da cultura do compartilhamento e da solidariedade. Além da troca de informações sobre boas práticas, é preciso pensar em soluções para superar a fragilidade fiscal das pequenas cidades, como consórcios de gestão para custear a elaboração de planos e projetos que viabilizem o acesso a recursos orçamentários, financiamentos e inclusive programas subsidiados por organismos internacionais;
- Integrar, com metas claras, a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável nos planos dos governos locais e metropolitanos;
- Valorizar o aspecto educacional das ações de sustentabilidade, à medida em que forem implementadas, contribuindo para formar melhores cidadãos para atuarem nas cidades;
- Utilizar o ordenamento jurídico ambiental como instrumento de gestão urbana para assegurar a proteção das encostas íngremes, fundos de vale e mananciais, de maneira a evitar deslizamentos, desmoronamentos, assoreamentos, enchentes, desabastecimentos e uma diversidade de problemas relativos à saúde pública;
- Evitar a reprodução na cidade do modelo patrimonialista que permeia a sociedade brasileira. É preciso, por exemplo, abandonar o modelo de implantação de habitação para população de baixa renda em áreas periféricas, enquanto há vazios nas áreas centrais com infraestrutura subutilizada. Da mesma forma, os recursos destinados à mobilidade urbana devem privilegiar investimentos em transporte público ao invés da expansão de vias expressas para carros.
- Estimular o uso de dados para construção das ferramentas de planejamento e gestão;
- Criação de redes de cidades integradas a um conjunto de outras redes e instâncias que possam contribuir com a informação e a divulgação de boas práticas de gestão e planejamento que possibilitem a inclusão social, o crescimento econômico sustentado e a proteção do meio ambiente.
A cidade é para as pessoas! Em favor delas, nesse momento cabe a vocês, Prefeitas e Prefeitos, o protagonismo da abordagem e implementação do Pacto pelo Direito à Cidade.
Os arquitetos e urbanistas do Brasil estão prontos para cumprir sua parte, levando Arquitetura e Urbanismo para Todos, missão estratégica do CAU.
Brasília, abril de 2017
13 respostas
Muito bom, abs!
Achei uma ótima ideia essa carta dos cem dias, mas é preciso fazer um levantamento nas cidades brasileiras, porque existem ainda cidades, no Brasil, que não incluem arquitetos na suas gestões, ou seja, as prefeituras constroem sem planejamento urbano adequado, excluindo a experiência dos profissionais de arquitetura e urbanismo!
Excelentes considerações quanto ao montante de verba destinada às 17 metrópoles e o restante dos municípios brasileiros.
Sensacional esta carta do CAU/BR.
documento necessario que deve se tornar a Biblia de todosos Prefeitos e Gestores Municipais
Comungo positivamente de poucos pontos desta carta. Visualizo um comportamento radicalmente ideológico politicamente, socialista, retrógrado, ultrapassado, sem nenhuma modernidade, principalmente sem praticidade, sem viabilidade, mais uma utopia. Não é assim que se constrói ou transforma cidades dentro da realidade e praticidade. Por isso que muitos urbanistas, neste caso direcionados pelo CAU/BR se distanciam da realidade, dando ilusões. Com esta carta, os prefeitos se distanciarão ainda mais dos urbanistas, pois visualizam a total falta da realidade, praticidade e objetividade.
A leitura do CAU sobre a MP 759/2016 parece açodada. Pela primeira vez se tornará possível promover a regularização fundiária (urbanística e ambiental) dos núcleios urbanos informais, coisa que a legislação até então em vigor não favorecia, ao contrário, a burocracia a ela imanente acabou criando um muro intransponível de irracionalidade.
Ótima iniciativa! Muito importante direcionar um documento como este aos gestores, que devem preconizar por pautas significativas como estas e atuar a favor do desenvolvimento sustentável. Através do prisma da área técnica da arquitetura e urbanismo é possível elencar as pautas, desafiando novos horizontes para serem construídos.Vou convidar os colegas e entregar pessoalmente uma cópia ao Executivo.
Primeiro será preciso consertar os erros da gestão anterior, baseado em modelos universalizadores ligados a rede de entretenimento do turismomundial. Exelentes propostas para um longo prazo!
Onde está o registro de participação do CEAU/Cau/BR. Cau não representa arquitetos e urbanistas.
Sim a carta é muito boa, porém não vejo aplicação agora, mas no futuro próximo acredito que vamos implementar essas premissas… Gostamos muito dá simplicidade… E essa carta primeiro tem que ver é rever as necessidades humanas… Pensar simplifica as nossas ações…!
Como a maioria dos gestores públicos não sentam nos bancos dos cursos de arquitetura e urbanismo, ou de geografia, mesmo com vários deles com pouca carga horária para bom domínio dos alunos em planejamento urbano e regional, a Carta é fundamental vez que o centro das questões é de fato Gestão – onde se decide politicamente!
E Gestão é ideológica, mesma. E a ideologia para as cidades já consta nos incisos do Art. 2o. do Estatuto da Cidade. Lá está o que é a Cidade Sustentável. Divulguemos a Carta e cobre-se mais a aplicação do Estatuto da Cidade e o da Metrópole!
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Infelizmente essa iniciativa de esclarecimento aos “Novos Gestores Públicos” por parte do CAU/BR (muito válida), não abrangeu uma outra questão não menos importante, que trata das ATRIBUIÇÕES PROFISSIONAIS PRIVATIVAS do Arquiteto e Urbanista.
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Lamentavelmente, o CAU/BR perdeu uma grande oportunidade de colocar também essa questão, esclarecendo aos Prefeitos que acabam de assumir, que as Prefeituras não podem aprovar Projetos de Parcelamento de Solo (Loteamentos, desdobramentos/desmembramentos/agrupamentos… etc), Estudos de Impactos de Vizinhança, Projetos Arquitetônicos… etc. Assinados por Profissionais NÃO REGISTRADOS NO CAU/BR.
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Mas acredito que ainda está em tempo de fazê-lo !!!