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DIA INTERNACIONAL DA MULHER: o espaço da mulher na Arquitetura e nas cidades

“A cidade segura para as mulheres é segura para todos”, afirma a diretora executiva da UN Habitat, a urbanista e ex-prefeita de Penang Island, na Malásia, Maimunah Mohd Sharif. A UN-Habitat apoia os países na implementação das dimensões urbanas da agenda de desenvolvimento sustentável para tornar cidades e assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis. Como instituições reguladores e fiscalizadores da profissão que molda os espaços da moradia e do exercício da cidadania, o CAU/BR e os CAU/UF têm papel fundamental nesse contexto, pois podem esclarecer a sociedade sobre a importância do direito universal à cidade. Assim, buscam  seu protagonismo como referência em planejamento e gestão democrática e inclusiva, especialmente porque mais da metade da categoria de arquitetos e urbanistas é composta por mulheres.

 

Maimunah Mohd Sharif (Foto: Acervo pessoal)

 

A construção ou a transformação dos espaços urbanos precisa compreender e incluir as demandas das mulheres, recentemente inseridas no fluxo produtivo das cidades, que há décadas atende os interesses dos homens. “A defesa que o CAU/BR faz da Arquitetura e Urbanismo para Todos reafirma a necessidade de se efetivar cenários em que as mulheres possam alcançar o direito de circular com segurança; acessar todos os lugares que desejarem; dispor de equipamentos públicos que atendam às demandas das atividades que realizam sozinhas ou com seus familiares; de espaço para o empreendedorismo e a participação política”, afirma Nadia Somehk, coordenadora da Comissão Temporária de Equidade de Gênero do CAU/BR, criada em 2019. 

 

Atender as demandas das mulheres no planejamento urbano não implica fazer uma cidade especializada unicamente para elas, excluindo o lugar e as necessidades dos outros cidadãos, mas afirmar uma perspectiva que representa uma nova abordagem de inclusão, do olhar, da opinião, da percepção e da contribuição das mulheres na construção da cidade contemporânea, trazendo uma nova dimensão ao desenvolvimento da cidade e da sociedade. Pensar as cidades a partir das necessidades de uso das mulheres é refletir sobre a infraestrutura do espaço urbano para responder às atividades do cotidiano também delas.

 

A arquiteta espanhola e professora da Escola Técnica de Ensino Superior de Barcelona, Zaida Muxi, afirma que a estrutura urbana das cidades se mantém e se transforma com prioridade para atender a demanda do fluxo econômico e as prioridades masculinas. “Uma vez que a cidade é pensada por homens, e para atender o fluxo dos homens, é necessária a revisão desta realidade incluindo as mulheres, permitindo que se lance uma nova construção pautada na visibilidade e no protagonismo em defesa de suas demandas na cidade”, afirma Zaida Muxi.

 

Zaida Muxi (Arquivo: Acervo pessoal)

 

 

Cidades como Barcelona, Viena, Paris, Buenos Aires e Bogotá já têm guias, diretrizes e iniciativas que abordam questões de gênero e a interseccionalidade no planejamento urbano e nas políticas públicas. Em Barcelona, o Manual de Planejamento Urbano na Vida Cotidiana – com perspectiva de gênero propõe um modelo urbano inclusivo, onde a diversidade de gênero, idade ou origem podem ser acomodados para construir uma cidade e tem como eixos o território, o social, a habitação, a mobilidade, a autonomia e o tempo.

 

“Manual de Planejamento Urbano na Vida Cotidiana – com perspectiva de gênero”, de Barcelona. 

 

Enquanto isso, em Bogotá, na Colômbia, a Secretaria Distrital das Mulheres idealizou a campanha “Movo-me com segurança”, para melhorar a prevenção da violência contra mulheres no espaço público. Como parte da campanha, o “Projeto Piloto de Planejamento Tático”, organizado pela ong Bicistema, identificou os pontos mais perigosos da cidade e realizou intervenções nessas localidades. O objetivo era melhorar os espaços adjacentes às ciclovias, a infraestrutura, as estradas, o espaço para pedestres e o transporte público, por meio de operações táticas de planejamento urbano que são facilmente executadas, como a pintura das ruas.

 

Reportagem do ArchDaily relatou o “Projeto Piloto de Planejamento Tático”, qu realizou intervenções nos pontos mais perigosos de Bogotá para tornar a cidade mais segura para mulheres e para pedestres. 

 

Em Viena, Áustria, um estudo de 1966 pesquisou porque menos meninas usavam os parques públicos se comparadas ao número de meninos. A conclusão dos pesquisadores foi de que os meninos se sentiam mais seguros nos parques e as meninas geralmente ficavam de fora nessa competição devido a limitação do espaço. Após o estudo, a cidade iniciou um projeto de redesenho do parque, adicionando mais acesso e paisagismo para dividir grandes espaços abertos em seções menores. Nas últimas duas décadas, Viena realizou mais de 60 projetos-piloto em setores como transporte público, moradias e trilhas, com o objetivo de incorporar a igualdade de acesso para mulheres e homens no planejamento urbano.

 

O estudo realizado em Viena, na Áustria, em 1966, pesquisou porque mais meninos utilizam os parques públicos do meninas. Fragmento retirado do ArchDaily. 

 

Em 2018, a prefeita de Paris, Anne Hidalgo, lançou o Guia de Referência: Gênero e Espaço Público destinado a arquitetos, urbanistas e demais atores responsáveis pelo planejamento urbano, para incentivar escolhas que atendam ao imperativo da igualdade de gênero. O guia foca suas ações em temas como a circulação; ocupação do espaço (caminhada e práticas esportivas); estar presente e visível; se sentir segura e participação nas políticas públicas. Também pretende revisar julgamentos ou métodos de ação pré-estabelecidos para permitir uma nova visão do espaço público e envolver políticas para o bem-estar das crianças.

 

“Guia de Referência: Gênero e Espaço Público”, lançado em 2018 pela prefeita de Paris Anne Hidalgo. 

 

Na capital da Argentina, Buenos Aires, alguns conceitos de gênero foram incluídos no Plano de Mobilidade Sustentável da cidade, com o objetivo de incorporar as mulheres em todas as áreas. Em artigo publicado no Portal Apolitical, a subsecretária de Mobilidade Sustentável e Segura do Governo de Buenos Aires, Paula Bisiau, destaca que agora as mulheres fazem parte da vida pública, mas os espaços urbanos e as redes de transporte nem sempre alcançam e respondem às suas necessidades. “No setor de transporte, tão tradicionalmente masculino (ainda hoje em alguns países conservadores as mulheres mal têm acesso à carteira de motorista), incentivamos a incorporação de mulheres em todas as áreas. Queremos mulheres dirigindo táxis, ônibus e caminhões, e sabemos que isso não acontecerá por si só. É por isso que trabalhamos com o governo da cidade de Buenos Aires, empresas e aplicativos de transporte, sindicatos e organizações da sociedade civil para conseguir isso”, destaca a subsecretária.

 

Paula Bisiau (Foto: International Transport Forum https://bit.ly/38mG5CM)

 

Segundo a arquiteta argentina e ativista social dos direitos humanos e das mulheres, Ana Falú, e a socióloga holandesa, Saskia Sassen, conhecida por suas análises nos fenômenos de globalização e de migração urbana, e por ter cunhado o termo “cidade global”, as cidades (e não os governos) são os locais onde a cidadania e a representatividade são construídas e co-exercidas. A arquiteta e urbanista brasileira, Ana Gabriela Godinho, no artigo Cidade, Gênero e Primeira Infância: Modos de Intervir em Territórios Urbanos Vulneráveis, de 2018, reafirma essa premissa. “Os conhecimentos oferecidos pela Arquitetura e Urbanismo para o desenho e construção dos espaços físicos, incluídos aí os processos de projeto participativo, que reconhecem a potência e os saberes não formais de quem vive a problemática destes territórios, constituem-se em importante insumo para a eficácia da implementação de políticas públicas participativas de movimento da base para o topo, bem como projetos sociais que dependam, em alguma medida, do suporte físico de um edifício ou infraestrutura urbana”, destaca.

 

Ana Falú (Foto: Acervo pessoal)

 

Saskia Sassen (Foto: Alex MacNaughton para Saltamos , 2017)

 

Ana Gabriela Godinho (Foto: CAU/PR)

 

Por Ana Laterza, arquiteta e urbanista, analista técnica da Comissão Temporária de Equidade de Gênero do CAU/BR, e Daniela Sarmento, presidente do CAU/SC e coordenadora-adjunta da CTEG

 

Colaboraram Socorro Aquino, jornalista, e Beatriz Castro, estagiária de Jornalismo (sob supervisão de Júlio Moreno)

 

Veja também: DIA INTERNACIONAL DA MULHER: as ações do CAU em defesa da Equidade de Gênero

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