“Sua arquitetura não importa, se ela não se importa com as pessoas”. Foi com essa frase, parafraseando a arquiteta Naila Opiangah, que a arquiteta e urbanista Luiza Coelho abriu a Atividade de Letramento sobre Arquitetura em Diáspora e Disputas da População Preta no III Encontro da Diversidade do Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU), realizado na Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal da Bahia (UFBA), em Salvador.
A fala de Luiza Coelho trouxe à tona o manifesto de Opiangah, elaborado após o assassinato de George Floyd, em 2020, destacando os desafios enfrentados por pessoas pretas na indústria da arquitetura nos Estados Unidos. Para o Brasil, a arquiteta ressaltou que, embora avanços tenham ocorrido na representatividade negra nos últimos anos, o processo de inclusão ainda não é o suficiente. “O letramento racial passa por reconhecer os problemas, como o da branquitude, e entender os avanços e desafios que permanecem após uma década de políticas afirmativas”, afirmou.
A arquiteta e urbanista Cláudia Sales compartilhou sua experiência de enfrentamento ao racismo desde a infância. “O racismo é uma violência no presente, que nos remete a um passado ancestral”, disse. Sales destacou que o letramento racial pode mitigar os impactos históricos do colonialismo, promovendo novas formas de ocupação nos espaços de poder. “Sempre seremos resistência e lutaremos pelo direito, não apenas de existir, mas de ocupar”, enfatizou, informando que está desenvolvendo um projeto-piloto de um curso de letramento racial.
Outro exemplo de atuação transformadora foi apresentado pela arquiteta e urbanista Raquel Freire, do Coletivo Calunga, da Universidade de Brasília (UnB). O grupo, formado por estudantes negros, pesquisa relações étnico-raciais no planejamento urbano de Brasília e celebra conquistas como a inclusão de uma cadeira de igualdade racial no Plano Diretor de Ordenamento Territorial (PDOT). “Somos coletividade e iniciativas como essa mostram o poder de ações que nasceram sem orçamento. É o nosso recado: fortaleça essas iniciativas, afirmou Freire.
Patrimônio Cultural Afro-brasileiro
O evento também destacou a importância do patrimônio cultural afro-brasileiro. A conselheira estadual Nathália Pedrozo, do Rio Grande do Sul, lembrou que referências culturais como música, dança, religiosidade e saberes são parte essencial da identidade nacional.
Já a arquiteta e urbanista Michele dos Santos Maciel apresentou um estudo sobre os desafios de preservar patrimônios afro-brasileiros em Santa Catarina, como o Clube União Operária, em Criciúma, e os terreiros de candomblé. Maciel destacou o histórico de preservação nacional, iniciado com o tombamento da Casa Branca, em Salvador, em 1984, primeira vez que o Estado brasileiro reconheceu oficialmente uma tradição afro-brasileira.
Michele Maciel reforçou que a falta de preparo para identificar e valorizar esses bens culturais pode agravar a perda de importantes referências. “O tombamento de patrimônios afro-brasileiros faz parte das políticas afirmativas e é um passo necessário para reconhecer a plena humanidade do negro na construção do Brasil enquanto povo, nação e cultura, frisou, citando Kabengele Munanga.
O evento também homenageou o professor e ex-presidente do CAU/BR Guivaldo D’Alexandria Baptista (in memorian), que lecionou Ética na Faculdade de Arquitetura da UFBA e sempre apoiou ações inclusivas no campo da arquitetura.
Transmitido ao vivo, o III Encontro de Diversidade do CAU/BR reafirma o papel da arquitetura e urbanismo como instrumentos de luta pela equidade, preservação cultural e construção de espaços que respeitem e representem a diversidade brasileira. O evento termina nesta sexta-feira (22/11) e acontece em conjunto com o 10º Seminário Salvador e Suas Cores.
Assista à transmissão completa do evento no canal oficial do CAU/BR no YouTubee acesse as fotos no Flickr da autarquia.