Em 2025, Belém se tornará o epicentro das discussões climáticas globais ao sediar a 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP 30). A escolha da capital paraense ressalta o papel estratégico da Amazônia não apenas como maior floresta tropical do planeta, mas também como um dos principais reguladores climáticos globais. Nesse cenário, o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), uma das instituições mais renomadas no estudo da biodiversidade e ecossistemas amazônicos, desponta como uma peça-chave para a produção de conhecimento científico que pode fundamentar ações e compromissos climáticos.
Para entender como a ciência brasileira pode contribuir decisivamente para os debates e negociações na COP 30, o Perspectiva CAU entrevistou Henrique dos Santos Pereira, diretor do Inpa. Ele compartilhou as iniciativas e desafios da instituição, abordando desde o uso de modelagens matemáticas e a colaboração internacional até o papel do Brasil no avanço de soluções climáticas globais.
Henrique Pereira é agrônomo com mestrado em Ecologia pelo Inpa e doutorado em Ecologia na Pennsylvania State University. Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista.
Perspectiva CAU: Como o INPA pode contribuir, por meio de modelagens matemáticas, para prever cenários climáticos e apoiar decisões políticas na COP 30?
Henrique dos Santos Pereira: O Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) contribui fornecendo dados sobre as dinâmicas ecossistêmicas da floresta amazônica, que devem ser incorporadas aos modelos matemáticos de simulação climática para torná-los mais próximos da realidade biológica. Esses dados refletem a interação entre atmosfera, solo e floresta, como na dinâmica do fósforo enquanto nutriente limitante. Além disso, o INPA desempenha um papel essencial na validação desses modelos por meio de seus programas de pesquisa de longa duração, que monitoram as respostas das florestas às alterações climáticas. O instituto também desenvolve modelos próprios capazes de prever a dinâmica do desmatamento na região.
Perspectiva CAU: Quais projetos de pesquisa vinculados ao INPA estão focados em soluções climáticas, como otimização de recursos naturais ou gestão de riscos ambientais?
Henrique dos Santos Pereira: As alterações climáticas que vêm assumindo a forma de ondas de calor, estiagens prolongadas, enchentes extremas dos rios, etc., estão sendo investigadas pelo INPA, especialmente em relação aos impactos sobre ecossistemas, comunidades e populações biológicas e organismos. Esses estudos de base são fundamentais para que, em seguida, seja possível avaliarmos a resiliência desses sistemas e para prevermos as reais possibilidades de redefinição das estratégias de uso sustentável dos recursos naturais. Esse é o caso, por exemplo, das pesquisas desenvolvidas para avaliarmos o impacto das alterações nos regimes hídricos dos rios e planícies de inundação da região sobre a pesca do pirarucu em regime de manejo e sobre a fauna aquática da região.
Perspectiva CAU: De que forma os pesquisadores brasileiros, incluindo aqueles ligados ao INPA, estão colaborando internacionalmente para a elaboração de métricas mais precisas de emissão e captura de carbono?
Henrique dos Santos Pereira: Os grupos de pesquisa do INPA têm contribuído significativamente para estimativas de biomassa e carbono estocado nas florestas do bioma Amazônia, além de estudos sobre trocas de CO2 com a atmosfera por meio de fotossíntese e respiração. Essas informações são cada vez mais importantes, em especial com os avanços da regulamentação do mercado de crédito de carbono, tanto no âmbito da Convenção do Clima da ONU, quanto no plano nacional. Também são essenciais para as estimativas de estoque de carbono e de emissões evitadas para projetos baseados no mecanismo de REDD+ que permite a compensação pelos esforços do país pelo controle do desmatamento e degradação da vegetação nativa.
Perspectiva CAU: Quais são os desafios enfrentados por instituições científicas, como o INPA, para obter financiamento e apoio à pesquisa climática em um cenário global cada vez mais urgente?
Henrique dos Santos Pereira: Um dos desafios mais significativos é a redução da força de trabalho, com a diminuição do número de pesquisadores e técnicos em instituições como o INPA e outras Instituições Científicas, Tecnológicas e de Inovação (ICTs) brasileiras. Mesmo com maior aporte financeiro, a ausência de recursos humanos suficientes limita a capacidade de produzir resultados esperados. Além disso, é fundamental ampliar a cooperação internacional e os investimentos nacionais. A agenda científica brasileira também deve ser constantemente avaliada para alinhar os temas prioritários às demandas urgentes e de longo prazo.
Perspectiva CAU: Como o Brasil pode aproveitar a expertise de instituições como o INPA para liderar iniciativas tecnológicas e científicas discutidas na COP 30?
Henrique dos Santos Pereira: Os achados e registros científicos dos pesquisadores do INPA, juntamente com os de instituições parceiras, compõem um valioso acervo de conhecimentos considerados pelo Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC) para assessorar a Convenção do Clima. Além disso, os dados produzidos pelo INPA orientam o governo brasileiro nas negociações internacionais, na formulação de políticas públicas e na revisão das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), recentemente atualizadas pelo país.