Elaborada em 1964, a Carta de Veneza é uma referência importante para a preservação dos valores históricos e artísticos do patrimônio mundial. Considerada uma base ética para a tomada de decisões no campo da conservação, suas diretrizes continuam a orientar práticas e debates seis décadas depois. Durante o painel “Tecnologia e Inovação na Preservação” do seminário “Legados e Lições: Um Olhar sobre 60 anos da Carta de Veneza”, realizado em Olinda/PE, no dia 13 de agosto, a arquiteta e urbanista Marina Russell Brandão Cavalcanti, mestre em Preservação do Patrimônio Cultural, destacou o uso de tecnologias em desenvolvimento na conservação do patrimônio cultural.
Entre as ferramentas abordadas, destaque para a realidade aumentada, a digitalização 3D e a análise de materiais. Marina Cavalcanti explicou a diferença entre a realidade virtual e a aumentada, ilustrando com exemplos concretos. Enquanto a realidade virtual oferece uma imersão total em um mundo digital, a realidade aumentada combina o digital com o real, criando uma interface interativa. Ela citou o uso de impressoras 3D na recriação de maquetes, como ocorreu na da reconstrução da Catedral de Notre-Dame, em Paris, na França, destruída por um incêndio há cinco anos e prevista para ser reaberta em dezembro deste ano, destacando a velocidade e a riqueza de precisão dessa tecnologia.
Mariana Cavalcanti também apresentou exemplos de iniciativas internacionais, como a do Laboratório de Estudos sobre a Cidade Antiga (Labeca), no Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo, que utiliza o aplicativo Unity para reconstruir digitalmente ambientes da Grécia Antiga.
Outro exemplo foi o projeto Rome Reborn, que recria modelos digitais da Roma Antiga desde o primeiro assentamento da Idade do Bronze. Este projeto é pioneiro nos debates sobre a certificação científica de modelos digitais históricos, evidenciando a importância de embasar essas reconstruções em dados e fontes confiáveis, conforme os princípios da Carta de Veneza.
A especialista em Preservação do Patrimônio Cultural destacou que, no Brasil, a digitalização do acervo do Museu Nacional, no Rio de Janeiro, tem se destacado. Desde 2007, cerca de 300 peças foram escaneadas em 3D, incluindo o crânio de Luzia, o fóssil humano mais antigo das Américas. Após o incêndio de 2018, essas tecnologias têm sido fundamentais na preservação da memória do museu e na reconstrução de peças perdidas. A Missão da UNESCO tem colaborado para recompor digitalmente as obras que foram previamente digitalizadas.
Durante o painel também foi destacada a utilização da realidade aumentada para simular elementos históricos, como a do Palácio Monroe, e o uso de 3D em jogos hiper-realistas que ajudam a educar sobre o patrimônio cultural. Segundo Marina Cavalcanti, a certificação científica desses modelos digitais é fundamental para garantir sua precisão e valor educativo.
O painel integrou a programação da Semana do Patrimônio de Pernambuco, reunindo especialistas nacionais e internacionais para debater a relevância contínua da Carta de Veneza na preservação do patrimônio cultural. A discussão reforçou o papel das novas tecnologias como ferramentas poderosas para a conservação e educação patrimonial.
O seminário “Legados e Lições: Um Olhar sobre 60 Anos da Carta de Veneza” foi realizado conjuntamente pelo Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR), por meio da Câmara Temática de Patrimônio da Comissão Especial de Política Urbana e Ambiental (CPUA), do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Pernambuco (CAU/PE), da Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe), do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Minas Gerais (CAU/MG) e do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio de Janeiro (CAU/RJ).
O evento, que teve uma programação extensa nos dias 13 e 14 de agosto, foi transmitido ao vivo pelo canal oficial do CAU/BR no YouTube. Para quem não pôde acompanhar, as palestras estão disponíveis. Aproveite!