A segunda mesa do Ciclo de Debates sobre Patrimônio e Acervos discutiu estratégias para conservação, financiamento e salvaguarda. Foi um espaço para visibilizar técnicas e refletir sobre o papel dos órgãos e entidades que se dedicam ao tema. A atividade fez parte da programação paralela à exposição “Souto de Moura – Memórias, projetos e obras” no dia 25 de maio no auditório da Embaixada de Portugal, em Brasília.
Para o debate, o CAU Brasil contou com a participação do superintendente do IPHAN, Leandro Grass; da coordenadora do comitê nacional de documentação do ICOMOS Brasil e coordenadora geral do DOCOMOMO Brasil, Alcília Melo; da representante da Câmara Técnica consultiva do CONARQ, Monica Frandi Ferreira; e o representante do Fórum de Entidades em Defesa do Patrimônio, Danilo Matoso. A mediação ficou a cargo do professor Márcio Carvalho, técnico/arquiteto na na Superintendência Estadual do IPHAN no Ceará.

Leandro Grass se declarou “animado e motivado” para sua missão na gestão do IPHAN e saudou a iniciativa do debate. “É uma reflexão importante neste momento de reconstrução do país”, disse. O superintendente mencionou algumas ações e intenções que norteiam a condução da pasta, como a reconstituição do conselho de participação social, a valorização dos servidores e o fortalecimento interinstitucional com outros ministérios.
Ele reconheceu o atual estado de descuido com os acervos brasileiros e disse que a valorização desses materiais “é uma missão não apenas do IPHAN, mas do Brasil”. Também elogiou o trabalho dos arquitetos e urbanistas que atuam na preservação patrimonial. “Tivemos oportunidade de conhecer o trabalho desenvolvido na Câmara dos Deputados após as depredações ao patrimônio em 8 de janeiro e este episódio foi um exemplo da importância de fortalecer o trabalho técnico de conservação e restauro. É muito bom saber que temos soberania, qualidade e condições de fazer uma boa política a partir de nós mesmos. Isso sim é patriotismo”, afirmou.
No palco do Ciclo de Debates promovido pelo CAU, Grass disse que o destino de acervos de arquitetos brasileiros também vem ganhando atenção do IPHAN e anunciou que o Instituto vem defendendo o uso do Palácio Capanema, no Rio de Janeiro, como destino para o acervo de Oscar Niemeyer.
Para ele, a gestão das políticas culturais do Brasil devem ser conduzidas para “reafirmar pressupostos democráticos” e valorizar dimensões historicamente invisibilizadas, do patrimônio imaterial, como as matrizes africana e indígena e memória sensível da ditadura. Para dar conta destas demandas, alertou, será necessário ampliar o repertório técnico. “Vamos precisar de flexibilidade para adentrar neste espaço do universo popular. O tombamento de terreiros, por exemplo, não terá os mesmos parâmetros dos acervos tradicionais. Se quisermos fincar raízes na democracia, precisamos inovar na linguagem e nos métodos”, disse.

Monica Fradi Ferreira falou sobre o arcabouço legal que define a política de arquivos públicos e privados, sob responsabilidade do Cadastro Nacional de Entidades Custodiadoras de Acervos Arquivísticos (CONARQ). O conselho criou recentemente uma Câmara Técnica para tratar especificamente da Arquitetura e Ambiente Construído. A instância pretende realizar estudos para definir normativa para uma política de preservação, acesso e difusão de documentos de arquivo. O resultado dos estudos deve constituir uma publicação técnica.
A partir da experiência como gestora do arquivo público municipal de Rio Claro, no interior de São Paulo, Monica Fradi Ferreira apresentou parâmetros e procedimentos de arquivamento úteis para organizar acervos de arquitetura. Também falou sobre os projetos realizados pelo arquivo público para popularizar os acervos, como exposições, jogos pedagógicos e outros eventos.
Ao final, reforçou a qualidade técnica dos profissionais que se dedicam à conservação e difusão dos acervos no país. “O Brasil tem profissionais capacitados. O que falta é recurso, e por isso precisamos discutir fomento”, afirmou.

O arquiteto e urbanista Danilo Matoso falou em nome do Fórum de Entidades em Defesa do Patrimônio. A organização foi criada em 2019 por entidades e coletivos da sociedade civil para lutar contra o desmonte do IPHAN e o Patrimônio Cultural Brasileiro. O coletivo estrutura uma política nacional de acervos que prevê cadastro nacional de entidades e a criação de um sistema nacional capaz de fomentar a preservação e o acesso aos acervos.
Danilo Matoso afirmou que a arquitetura ainda precisa se firmar como cultura no Brasil e destacou o papel do CAU e das entidades que fazem parte do CEAU neste desafio.

A coordenadora do comitê nacional de documentação do ICOMOS Brasil e Coordenadora geral do DOCOMOMO Brasil, Alcília Melo, dirigiu sua intervenção ao superintendente do IPHAN para reforçar o pedido de atenção aos acervos brasileiros. A arquiteta e urbanista falou sobre a condição de abandono de patrimônios edificados e documentais e da recorrente fuga de acervos do Brasil.
Segundo Alcília, a rede brasileira do DOCOMOMO congrega diversas profissões interessadas na preservação da arquitetura, do urbanismo e do paisagismo moderno e dispõe de relatórios e diagnósticos de acervos em diversos estados do país. Recentemente, a organização fez um debate profundo sobre o tema durante o Seminário de Documentação: arquivos e acervos da modernidade brasileira – Sedoc.
Já o ICOMOS Brasil possui 17 comitês científicos que dispõem de informações para radiografias precisas das condições dos acervos regionais. “Temos metodologias, tecnologias de aquisição de dados e de documentação. Produzimos seis dossiês em parceria com universidades”, afirmou.
SAIBA MAIS SOBRE OS PALESTRANTES
A programação paralela à exposição Souto de Moura contou com outros três encontros dedicados à memória, aos projetos e às obras do arquiteto português, ganhador do prêmio Prietzker de 2011 e do Leão de Ouro da Bienal de Arquitetura de Veneza em 2018. A mostra esteve aberta a visitação entre 22 de março e 21 de maio no Paço Imperial do Rio de Janeiro. Foi iniciativa da embaixada de Portugal no Brasil, do Consulado-Geral de Portugal no no Rio de Janeiro e do Instituto Camões – Centro Cultural, em Brasília. Também contou com a parceria da Casa da Arquitetctura e patrocínio da Petrogal Brasil. Também foram apoiadores da mostra o CAU/RJ, o IAB nacional e seu departamento no Rio de Janeiro, e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).
Em breve, as gravações dos debates do Ciclo de Debates sobre Patrimônio e Acervo – Memórias da Arquitetura Brasileira estarão disponíveis no canal do CAU Brasil no Youtube. Assine e receba as notificações.
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