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II ARQAMAZÔNIA: Congresso apresenta exemplos de Arquitetura Sustentável

Mirante do Gavião Amazon Lodge, em Manaus
Mirante do Gavião Amazon Lodge, em Manaus

 

O II Congresso Internacional de Arquitetura e Sustentabilidade na Amazônia (II ArqAmazônia) reúne em Manaus pesquisadores e projetistas de diversos países latinoamericanos, que no primeiro dia de evento trouxeram para o público exemplos de como a Arquitetura pode transformar o meio ambiente sem prejudicá-lo, usando materiais renováveis e técnicas de conforto técnico e ambiental. “Não deveria existir essa definição de ‘arquiteto sustentável’. Toda arquitetura deveria incorporar esses conceitos”, afirmou a arquiteta e urbanista Patricia O’Reilly.

 

Patricia apresentou o projeto Mirante do Gavião Amazon Lodge, hotel localizado no Rio Negro, em Manaus. Para fazer o hotel, Patricia buscou o conhecimento de Seu Aderson, um conhecido construtor de barcos amazonense. De início, Aderson recusou a missão, afinal ele era um construtor de barcos, e não de edificações. “E se a gente fizer um barco de cabeça para baixo?”, perguntou Patrícia. Deu certo. Aliando o conhecimento tradicional dos barqueiros com um software que calcula o nível de conforto térmico de edificações, Patricia fez o chamado desenho bioclimático: usar o clima local em benefício da Arquitetura.

 

“Tivemos que usar ar-condicionado para garantir a melhor temperatura, mas com inteligência, para corrigir apenas o que o desenho bioclimático não conseguia. Os brises no teto criaram uma microventilação entre as hastes, fazendo o resfriamento da cobertura, sem precisar de isolamento térmico”, explica. Segundo ela, o objetivo é sempre dimensionar o projeto de forma para usar o minimo de recursos possíveis. Captação de chuva, placas fotovoltaicas, horta orgânica, tudo entra no projeto. “Hoje já é possível fazer projetos sustentáveis sem sobrecusto. Há cinco anos não era possível”.

 

Construção feita com taipa ensacada
Construção feita com taipa ensacada, no Amapá

 

ARQUITETURA DE TERRA

A arquiteta gaúcha Viviane Martins apresentou seu projeto para a Base de Apoio da Reserva Biológica do Lago Piratuba, no Amapá. O projeto foi estruturado com paredes de taipa ensacada, painéis de serragem e cimento, sanitário seco e cisternas para captar água da chuva. “Construção sustentável deve privilegiar materiais locais, cuja extração cause o mínimo de impacto ambiental”, afirmou. No caso da base de apoio, as vantagens são a facilidade para treinar a mão de obra, a fácil aplicação e baixo impacto ambiental. As desvantagem é o peso excessivo e dificuldade de instalação (as paredes ficam com 30cm de largura).

 

Vitor Pessoa, do escritório Vipe Arquitetura, trouxe o projeto de uma residência em Manaus, em um local com mata densa e próxima aos rios. “Queríamos um ar contemporâneo, mas com respeito ao meio ambiente. A casa está em um terreno arenoso, boa parte da casa é suspensa, como nas palafitas, e isso ajuda na ventilação. Nós trabalhamos com madeira certificada, 80% do piso eh de madeira local”, afirmou. A sede do escritório também é suspensa, e feita com contêineres. “Em Manaus, uma cidade industrial, há bastante descarte de contêineres. O desafio é a questão térmica: tratamos os contêineres com drywall e isolantes térmicos, com exaustores entre as paredes”, revelou. O uso dos contêineres também se justifica pelo fato de o terreno ser alugado. Assim, o escritório pode mudar sua localização aproveitando até 90% do que foi construído.

 

Já o pesquisador mexicano Luis Alberto Torres Garibay apresentou como são feitas as casas de madeira dos povos indígenas da região de Michoacán, no México. São casas quadradas e pequenas, compostas geralmente por um quarto, com varanda e sem janelas, e usadas apenas para dormir, já que as comunidades convivem em tem amplos pátios integradas à lavoura. A mesma construção é usada também para vendas e comércios. A fundação é feita de pedras, cobertas por um tablado de madeira. Tudo é feito manualmente. A madeira das paredes passam por varios processos de corte e desgastamento. “Essa atividade está se perdendo pela aparição de novas tecnologias e da pobreza em que vivem essas comunidades indígenas. Está se perdendo essa transmissão de conhecimento e os processos de sustentabilidade”, afirma Luis. “É um patrimônio que deve ser preservado, nas construções em madeira estão os valores de uma comunidade, a manufatura, os modos de vida, as ferramentas e muitos outros aspectos culturais”, destacou.

 

Casa de madeira em Michoacán, no México
Casa de madeira em Michoacán, no México

 

VEGETAÇÃO E TEMPERATURA

O arquiteto Jaime Kuck, presidente do CAU/AM, lembrou dos projetos que o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) financia em Manaus. Na tentativa de melhorar as vias da cidade, ocupa-se os fundos de vale com concreto, o que altera o microclima da área. “Se nós mantivéssemos a vegetação, teríamos microclimas melhores, com mais ventilação”, explica. “Nós estamos indo na contramão dos desafios urbanos e ambientais. Para reverter isso, a gente precisa olhar o discurso dos nossos candidatos, para ver se eles têm projetos urbanos sustentáveis de médio e longo prazo”. Jaime Kuck pede que haja incentivo governamental para desenvolver a indústria de técnicas construtivas sustentáveis, para que essas técnicas sejam mais disseminadas.

Viviane Martins destacou que a disseminação de tecnologias sustentáveis às vezes é mal-recebida pelos técnicos das prefeituras que aprovam os projetos. “O sistema fossa-filtro-sumidouro é insustentável, mas se você fizer outra proposta, como tratamento por zonas de raízes, o técnico da prefeitura não sabe o que é isso, não vai aprovar”. Ela destaca que os projetos precisam ter significado para a população, ela precisa participar dessas escolhas.

 

O presidente da Federação Pan-Americana de Arquitetos, João Virmond Suplicy Neto, destaca que a Arquitetura deve sempre atentar para os materiais, o clima e aos usos e costumes da região. “Matéria-prima local é a base da sustentabilidade”, afirma. Como exemplo, ele lembrou as obras de Severiano Porto que se utilizam de técnicas tradicionais das populações amazonenses, como o uso de palafitas, varandas e redes. “Severiano soube fazer a tradução de elementos indígenas para a arquitetura contemporânea”, diz João. O professor Roger Ibrahim também citou Severiano como referência na área, mostrando suas obras na Universidade Federal do Amazonas (UFAM). “Vegetação mantém a umidade alta e a temperatura baixa. Tem que ter ventilação no ático, e os beirais ajudam as paredes a não esquentarem muito nem molharem”, afirma. “Arquitetura Sustentável não é um nicho de mercado, é uma proposta de como construir as cidades. Nós temos que ter domínio técnico e cultural da profissão”, diz o arquiteto Marcelo Borborema.

 

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Publicado em 15/09/2016

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