Em meados de 1882, o Imperador Pedro II criou programa habitacional de interesse social e foi precursor no uso de PPPs (Parceria Público Privada), do MCMV (Minha Casa Minha Vida) e em concessões a empresários, semelhantes às da MP 700.
Mas se fizermos um imaginário retorno ao passado, com alguma sorte veremos D. Pedro II sendo aplaudido por duques, barões, marqueses, condes, membros da corte, senadores e empresários, quando assina o Decreto Imperial de no 3151 ao lado de ministros. O Decreto autoriza Américo Castro e “as empresas que se organizarem” a construírem “edifícios para habitação de operários e classes pobres, na cidade do Rio de Janeiro e seus arrabaldes.” Para incentivar empresário, o Imperador concede isenção, por 20 anos, do imposto predial “destinado aos serviços de limpeza das casas e do esgoto da cidade,” cessando o benefício quando as empresas venderem os edifícios. Também “dispensa, por 20 anos, do pagamento do imposto de transmissão de propriedade do imóvel” e dá “concessão gratuita do domínio útil dos terrenos do Estado compreendidos nos planos.” – muito semelhante ao GDF quando cede glebas da TERRACAP para conjuntos habitacionais do programa MCMV e para oficinas e pátios de empresas de ônibus.
A Corte também deve ter aplaudido o Marques de Paranaguá, responsável por implantá-lo “assim que o tenha entendido.” Como consta no Decreto. E mesmo não tendo fotos e encartes na mídia, com imagens da cerimônia, como cronista imaginário que participa de importante cerimônia no Paço Imperial, vejo alegria e satisfação nos olhares de Américo de Castro e de outros empresários. Todos sabem que, para construção dos edifícios deverão pagar o valor das obras que demolirem “em cortiços condenados pelas autoridades competentes” e que terão de “apresentar estatutos, planos e projetos.” Mas o Decreto também garante “o direito de desapropriação relativamente aos terrenos particulares compreendidos nos ditos planos.” Todos os presentes aplaudem – há algo de novo na política social do Império.
Hoje lá em cima, a decisão de D. Pedro II ressurge. Nas PPPs, a relação público-privada inclui doações de terras públicas para empresas que constroem e vendem; a política habitacional estimula empresas que construam edifícios para operários e pobres, e não dá maior apoio às famílias que queiram fazê-lo. E faz pouco, a MP 700 de dezembro de 2015, estabeleceu que, mediante lei ou contrato, o “empresário concessionário, permissionário, autorizatário ou arrendatário”poderá promover desapropriação – com mais poderes que Américo de Castro e que outros detiveram.
Os fatos podem nos levam à conclusão de que procedimentos do patrimonialista Império brasileiro estão sendo adotados em pleno século XXI.
Artigo do arquiteto e urbanista Jorge Guilherme Francisconi, ex- Secretário Executivo da CNPU (Comissão Nacional de Regiões Metropolitanas e Política Urbana)/SEPLAN e ex-presidente da EBTU (Empesa Brasileira de Transportes Urbanos)
Publicado em 24/02/2016