Jane Jacobs foi estenógrafa, jornalista free-lancer, editora e cursou Geologia, Zoologia, Direito e Ciências Políticas e Economia na Universidade de Columbia. O mais próximo que esteve da Arquitetura e Urbanismo foi o casamento com o arquiteto Robert Hyde Jacobs. O que não impediu que seu nome ficasse intimamente relacionado com o Urbanismo mundial em razão de seu ativismo na área e do livro “Morte e Vida de Grandes Cidades”.
Nascida em 1916, na pequena cidade de Scranton (Pensilvânia), em 1935 Jane foi viver com a irmã no bairro de Greenwich Village, em Nova York, e em 1968 tornou-se cidadã canadense, após mudar-se para Toronto, temendo com uma eventual convocação dos filhos para a guerra do Vietnã.
De uma certa forma, Jane tinha a mesma preocupação maternal com o destino dos pequenos e típicos bairros das grandes cidades, que a partir dos anos 50 começaram a ser ameaçados por operações de reurbanização e superhigways que demoliam não apenas casas, mas também o modo de vida das pessoas. E em defesa do “balé das calçadas” e dos “olhos na rua”, ela se jogou em uma “guerrilha”: manifestações públicas que ajudava a promover e que causaram inclusive, mais de uma vez, sua prisão nos anos 50 e 60.
Para Jane Jacobs, uma cidade interessante começa por uma calçada e uma rua interessante. Se elas são monótonas, a cidade terá a mesma aparência. Serpenteando edifícios e espaços públicos, as calçadas dialogam com eles as referências que identificam e caracterizam o lugar. “O balé da boa calçada urbana nunca se repete em outro lugar, e em qualquer lugar está sempre repleto de novas improvisações”, diz seu famoso livro.
Jane dizia ainda que os espaços públicos só conseguem ter vida pulsante se forem lugares seguros, o que exige os “olhos na rua”. Ou seja, lojas e janelas voltados para as calçadas que compõem “uma rede de fluxos de pessoas, mercadorias, matérias… energias em constante movimento”.
“Sob a aparente desordem da cidade tradicional, existe, nos lugares em que ela funciona a contento, uma ordem surpreendente que garante a manutenção da segurança e a liberdade. É uma ordem complexa”.
Com suas lutas, conseguiu salvar bairros inteiros da demolição, como o West Village e o Soho, e impedir a construção de algumas vias elevadas em Nova York. Naturalmente isso não foi nada fácil. “Por contrariar lobbies poderosos da cidade, Jane Jacobs dedicava muita energia à conquista de aliados. Visitava igrejas, templos evangélicos e sinagogas para pedir o apoio dos líderes religiosos”, narra seu biógrafo Anthony Flint.
E sabia, muito bem, criar situações embaraçosas para seus oponentes. Certa vez cercou a Washington Square com crianças para chamar a atenção da midia contra os planos que cortariam a praça com uma via expressa. E, embora pessoalmente só tenha cruzado com ele uma única vez, bateu boca frequentemente pela imprensa com engenheiro Robert Moses, o master builder que mais do que conduzir, impunha o planejamento de Nova York naquele tempo. “Só um punhado de mães é contra”, disse ele, nada democrático, em repúdio a protestos contra a construção a Lower Manhattan Expressway, que nunca se concretizou.
Jane Jacobs não deixou por menos. Precisando de uma canção de protesto contra as ideias do engenheiro, um amigo a levou para conhecer um jovem músico folk então desconhecido, um tal Bob Dylan, e com ele compôs a canção que empolgaria as manifestações dali para frente. O nome: “Listen, Robert Moses”. Segundo seu filho Jim, a ativista ajudou Dylan, explicando como uma canção de protesto deve ser estruturada para dar certo. “Acho que foi a primeira canção de protesto que ele escreveu”.
A música, cujo refrão fala na luta pelos direitos dos cidadãos, começa assim:
Escute, Robert Moses, ouça se puder
É sobre o nosso bairro que você está tentando condenar
Nós não vamos ficar sentados e assistir nossas casas serem derrubadas
Então, pegue a sua superhighway e coloque-a fora da cidade…
Clique no link para ver a letra completa de “Listen, Robert Moses”.
Jane Jacobs, que recusou o título de doutora honoris causa em Arquitetura e Urbanismo, viveu até 2006.
Robert Moses, nascido em 1888, viveu até 1981 . Na década de 50 ele elaborou, a pedido da Prefeitura, um plano de melhorias para São Paulo, propondo uma rede articulada de transporte coletivo (incluindo metrô) e, claro, vias expressas aos montes. Tudo ficou no papel.
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