
Os obstáculos dos municípios para a efetiva integração metropolitana e o cumprimento das previsões do Estatuto da Cidade e do Estatuto da Metrópole foi a principal questão discutida na mesa-redonda “Desafios do projeto de cidade: A Gestão Urbana Inserida no Compromisso com a Nova Agenda Urbana”. O debate, realizado na última terça-feira (04/04), fez parte do IV Seminário Nacional de Política Urbana e Ambiental, em Brasília. O evento foi promovido pela Comissão de Política Urbana e Ambiental do CAU/BR com o apoio do Fórum de Presidentes dos Conselhos de Arquitetura e Urbanismo dos Estados e do Distrito Federal.
O moderador da mesa-redonda, deputado Edmilson Rodrigues (PSOL/PA), afirmou que os municípios não podem se fechar para a integração regional, que tem amparo legal e tornou-se necessária para o planejamento urbano das metrópoles. “Para atender à previsão constitucional de planejar e executar funções públicas de interesse comum, os municípios precisam pensar que autonomia não se confunde com soberania. E o raciocínio para os resíduos, os transportes, deve ser esse, de políticas consorciadas necessariamente executadas entre os municípios. Há dificuldades entre os municípios se assimilarem em região metropolitana, supostamente com base na autonomia”.
Flávia Mourão, diretora-geral da Agência de Desenvolvimento da Região Metropolitana de Belo Horizonte, onde já exerceu também o cargo de secretária municipal adjunta de Atividades Urbanas, acredita que ainda não há uma compreensão da importância da integração efetiva entre os municípios das regiões metropolitanas brasileiras. “Temos dificuldades de reunir as 34 prefeituras da região metropolitana de Belo Horizonte, mesmo na Assembleia Metropolitana, que acontece uma vez ao ano”.

Segundo a engenheira civil, falta a noção de pertencimento regional à sociedade dos municípios que compõem a metrópole. “Ainda não temos o reconhecimento de uma cidadania metropolitana. Nos deslocamos para atividades da nossa vida dentro da região, então precisamos ter essa leitura para além do município. É preciso pensar no que o município pode oferecer para a região metropolitana ter um desenvolvimento integrado”.
De acordo com Ernesto Galindo, técnico em Planejamento e Pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA, que integrou a equipe responsável pela coordenação redação do relatório do Brasil para a Habitat III, é preciso conceber a gestão urbana regional de modo oposto ao hierárquico. “Um dos desafios consequentes da metropolização é a heterarquia, modelo de gestão baseado não em um poder centralizado vertical, mas em acordos, concessões e decisões multilaterais”, afirma.

Para Jório Cruz, conselheiro do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Pernambuco (CAU/PE) e ex-presidente da Fundação de Desenvolvimento da Região Metropolitana do Recife (FIDEM), o município é apenas uma concepção legal, já que a cidade real é de fato a região metropolitana. “Nenhuma autoridade definiu que a metrópole existiria. Ela passou a existir porque as cidades se conurbaram ou se tornaram interligadas – ela é a base. O município é uma parte, uma abstração técnica. Não é Recife que é a metrópole – a metrópole engloba Recife. A metrópole é a cidade feita de cidades”.

Cruz criticou o receio político dos gestores municipais em perder gestão no processo de integração metropolitana. “O prefeito não perde poder nenhum com o Estatuto da Metrópole, pelo contrário. Ele participa, para além do seu município, das decisões da região. Poder ele hoje perde para o Estado, que é quem faz a gestão da região metropolitana na ausência de uma integração entre os municípios”.
Para o conselheiro, “o ideal é que existisse um sistema único de gestão das metrópoles, como é o SUS para a saúde. mas ele precisa estar adequado a cada uma dessas metrópoles. No caso de São Paulo, nem vejo mais uma metrópole, e sim uma megalópole, muito mais complexa”. Ele criticou a visão de periferização de municípios da região metropolitana em detrimento do que tem maior poder econômico ou político. “A metrópole não pode continuar sendo vista como o ‘subúrbio’”.

Na visão da geógrafa Karla França, analista em Planejamento Urbano e Habitação da Confederação Nacional de Municípios (CNM) e conselheira do segmento do executivo municipal na atual gestão Conselho Nacional das Cidades (Concidades), grande parte das prefeituras ainda tem sérias dificuldades em compreender e planejar regionalmente. “A imensa maioria dos municípios brasileiros são pequenos, abaixo de 50 mil habitantes, 88%. Como a imensa maioria deles tem poucos habitantes e núcleos urbanos pequenos, arrecadação própria ínfima, não se trata de “preguiça fiscal” como é dito inúmeras vezes, mas sim de falta de base tributária. Na ponta, os prefeitos ainda estão tentando compreender o Estatuto da Metrópole – entender o que é e o que a gestão pode fazer para incluir essa agenda”.
Para ela, é preciso estimular os consórcios públicos entre municípios não apenas para a área de infraestrutura, mas também de gestão “Há uma série de leis obrigando a fazer planejamento para acessar recursos e cumprir obrigatoriedades e esses municípios têm dificuldades técnicas de executar essas exigências. Com os consórcios, você otimiza recursos, ainda mais em um período de crise como este”.

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