O trabalho do arquiteto e urbanista brasileiro precisa sair da invisibilidade para a visibilidade. Este é um dos principais objetivos da gestão 2021-2023 do CAU Brasil. Como fazer isso através do CAU?
Há muita produção arquitetônica de valor em nossas cidades. Ela está reunida em edificações saudáveis, confortáveis e belas e nos espaços públicos que preservam a natureza e são inclusivos. Lugares onde o arquiteto e urbanista atuou e pode conceber soluções espaciais funcionais com custos justos e adequados.
Apesar disso, muitas vezes esta produção é invisível para os olhos da maioria da população, diante do marcante indicador de moradias feitas sem projeto – 85% do total, segundo pesquisa DataFolha – e das imensas periferias que crescem sem planejamento e infraestrutura.
Entendemos que a reversão desse quadro começa justamente com a ampliação da atuação dos arquitetos em nossas cidades, concretizando a missão do CAU: Arquitetura e Urbanismo para Todos.
O desafio é popularizar e democratizar – em síntese, dar plena visibilidade – os serviços de Arquitetura e Urbanismo, mostrando para a população que nossos serviços são essenciais para dar segurança, conforto e sobretudo salubridade para as moradias.
Esta é a primeira marca que queremos fixar, o que necessariamente engloba a melhoria da relação com os profissionais. Outras marcas/desafios são fomentar a qualidade na formação dos arquitetos e urbanistas, incentivar a fiscalização como um vetor de melhoria do exercício profissional, incrementar as parcerias institucionais e promover ações inclusivas para diminuição das desigualdades através da arquitetura e urbanismo.
Um exemplo foram são as ações do programa “Mais Arquitetos” em defesa de moradia digna, objetivando contribuir para a reparação da precariedade habitacional escancarada pela pandemia da Covid-19, tão bem retratada em números da Fundação João Pinheiro.
Pesquisa de 2020 revela que, além de um déficit habitacional de cerca de 6 milhões de moradias novas, 25 milhões de domicílios existentes (1/3 do total) tem algum tipo de inadequação, sendo 11 milhões com carências edilícias, como ausência de banheiro exclusivo, cômodos improvisados em dormitórios e falhas de cobertura e pisos. O que demonstra que habitação social é uma questão de saúde pública.
A assistência técnica em habitação de interesse social, promovida pelo poder público, prevista na Lei da ATHIS (11.888/2008), é o instrumento para disponibilizar os serviços dos arquitetos para a população de baixa renda, de forma gratuita, uma vez que o poder público remuneraria a elaboração de projetos de reformas e construções.
O primeiro ano da gestão foi marcado por campanha de comunicação visando a conscientização da população mais carente sobre seu direito de usufruir da Lei da ATHIS, através de políticas públicas (até agora implementadas, infelizmente, em menos de 30 municípios).
Tivemos oito milhões de visualizações de posts de influenciadores digitais que dialogam com a população de baixa renda e realizamos “lives” de grande audiência com especialistas em habitação e saúde pública. Lançamos, no UIA2021RIO, o “Manifesto em Defesa de Moradia Digna”. Foi uma “semente” que igualmente mostrou que os 212 mil arquitetos e arquitetas do país dariam conta do atendimento a esta população, mas só um percentual pequeno conseguiu viabilizar uma atuação profissional nesse campo.
Buscando fomentar esta atuação, o CAU Brasil lançou um Edital de Patrocínio de ações ATHIS, disponibilizando um total R$ 1 milhão. O Edital obteve 44 inscrições de organizações da sociedade civil, tendo sido contempladas nove, todas coordenadas por arquitetos e todas prevendo articulação com políticas públicas. Em paralelo, diversos CAU/UF atuaram no mesmo sentido ou lançaram programas próprios, como o “Nenhuma Casa sem Banheiro”, do CAU/RS.
Em paralelo, realizamos ações junto ao Congresso Nacional para a destinação de verbas do orçamento da União para programas de assistência técnica, além de encontros com representações de Prefeituras e secretarias estaduais de Habitação.
A melhoria das cidades brasileiras necessita nossa atuação nesta escala maior do território, ocupado especialmente pela população mais pobre, mas exige também a presença do arquiteto e da arquiteta na escala menor, dispersa pelos bairros, onde estão os lares das famílias de classes médias urbanas. São famílias que têm condições de contratar nossos serviços, mas não o fazem por desconhecerem os benefícios agregados, acabando por cair nas mãos de leigos para realizarem irregularmente “projetos” ou obras. Estes são os públicos alvo da campanha “Mais Arquitetos” de 2022 que irá mostrar os diversos campos de atuação dos profissionais de Arquitetura e Urbanismo.
Para apoiar o exercício profissional de forma a atender as demandas do poder público e do mercado, a atual gestão definiu como prioridade zero, logo ao se instalar, o funcionamento de forma segura e eficiente do SICCAU, tornando-o mais amigável. A dinamização do processo de registro profissional e a implantação de formas contemporâneas de cobrança são objetivos que buscam facilitar os procedimentos administrativos de atendimento aos profissionais.
A segunda marca da gestão 2021-2023 do CAU Brasil diz respeito ao fomento da qualidade da formação dos arquitetos e urbanistas. O país inteiro tem hoje 875 escolas de Arquitetura, o que leva qualquer um a perguntar que qualidade de arquiteto estamos formando. Faz-se necessário zelar pela formação de arquitetos que atendam às necessidades do país, não pensem só em fazer arquitetura para elite.
Repetindo o que foi dito disse na primeira entrevista que concedi depois de eleita: nós temos que ter arquiteto pé no chão, arquiteto que faça o que o Brasil necessita.e isso não pode ser feito de maneira remota.O ensino de arquitetura exige contato presencial para se concretizar.
Estima-se que teremos, em três décadas, uma demanda de 40 milhões de residências e edificações em geral a serem construídas no país. Não faltará trabalho para bons profissionais, que necessitarão investir na formação continuada, outro ponto que o CAU Brasil deseja incentivar juntamente com a pesquisa e extensão.
Finalidade primeira de um conselho profissional, a missão que a atual gestão do CAU Brasil deseja imprimir à fiscalização é transformá-la em vetor de melhoria do exercício profissional de Arquitetura e Urbanismo. Sem perder seu rigor, buscando sempre a proteção da sociedade, a fiscalização dos arquitetos e urbanista deve ser um instrumento didático, que sirva para seu aperfeiçoamento profissional: orientação, não punição.
Preservando a autonomia dos CAU/UF, a ideia é desburocratizar trâmites administrativos para acelerar os processos, estabelecer indicadores de eficiência e padronizar a dosimetria das ações (preventiva, corretiva e punitiva) conforme as circunstâncias. A primeira de todas as ações é de comunicação, para esclarecer a sociedade sobre o trabalho do arquiteto e o papel do CAU. Uma regulamentação federal uniformizará os procedimentos para o envio dos casos de exercício ilegal da profissão aos órgãos oficiais de investigação, como a Polícia Civil e o Ministério Público.
Outra marca a ser perseguida consiste no incremento das parcerias institucionais do CAU, a começar com as entidades de Arquitetura e Urbanismo que compõem o CEAU. Vamos unir esforços para fortalecer e valorizar a Arquitetura, ‘desprecarizar” o trabalho do arquiteto e ampliar as chances para a legião de estudantes que estamos formando.
Somos um CAU único: o fortalecimento do Fórum de Presidentes possibilitará o planejamento e a operacionalização unificada de ações. O programa CAU Educa abriu perspectivas novas para o relacionamento com as escolas e professores de crianças e adolescentes, o que nos possibilita contribuir na educação dos cidadãos de amanhã sobre seu papel no enfrentamento da complexidade sócio-territorial das cidades e na consciência ambiental.
É nosso desafio a promoção de novas ações modernizadoras, inclusivas e de reparação das desigualdades através da arquitetura e urbanismo para além do que já está contido na jornada do “Mais Arquitetos” descrita no início deste artigo. A continuidade dos debates sobre gênero, raça e diversidade é essencial para trazer o CAU para o mundo contemporâneo.