“O Brasil perdeu uma grande oportunidade que não poderia ter perdido: não “convidar para a festa” da Copa e das Olimpíadas os arquitetos e urbanistas. Foi uma oportunidade histórica que poderia ter marcado nossas cidades com obras qualificadas”, afirmou o jornalista Raul Juste Lores, repórter especial da “Folha de S. Paulo”, durante o Seminário Nacional “Arquitetura e Urbanismo: diálogo com o futuro”, promovido pelo CAU/BR, por iniciativa do Colegiado das Entidades Nacionais dos Arquitetos e Urbanistas (CEAU) realizado no dia 27/10 em Brasília.
Para ele, não há diálogo com o futuro sem uma reflexão sobre o que se faz no presente. Da mesma forma, diz ele, desperdiçamos uma década ao deixar os arquitetos e urbanista de fora do programa Minha Casa Minha Vida. “Quando o arquiteto e urbanista não é chamado, todos sofremos, não apenas os profissionais. Todos os dias somos obrigados a passar horas no trânsito, cercado de feitura por todos os lados, porque a Arquitetura e o Planejamento Urbano não tiveram a mesma atenção que os governos dedicam ao mercado imobiliário”.
Segundo o jornalista, já houve momentos em nossa história que foi possível conciliar os interesses das cidades, dos arquitetos e do mercado imobiliário. Citou como exemplo o que se passou no mercado imobiliário de São Paulo na década dos anos 1950:
“Naquela época foram construídos dezenas de ícones da cidade, como o edifício Copan, o Conjunto Nacional e a Galeria Metrópole. Tudo sem dinheiro público, só com base em investimentos dos empreendedores, que nem de longe pensavam em ser mecenas: eles queriam o lucro, mas souberam investir na qualidade contratando bons arquitetos. Foi um momento raro em que o grande capital trabalhou com os arquitetos mais eruditos da cidade”.
O centro paulistano, a avenida Paulista e o bairro de Higienópolis ficaram marcados positivamente com tais obras, segundo o jornalista, que trata desse tema em livro a ser lançado em 2017. “Se o poder público tivesse aprendido a lição, a paisagem de São Paulo hoje seria diferente”.
Os arquitetos eram, em boa parte, muito jovens. David Libeskind, que aos 27 anos projetou o Conjunto Nacional, exemplar construção de uso misto, com lojas, livrarias, restaurantes, escritórios e apartamentos residenciais, o que lhe garante vida 24 horas por dia. “Na época ele morava em uma pensão e usava uma prancheta emprestada. E teve uma única semana para fazer o projeto”.
“Os arquitetos e urbanistas serão muito relevantes enquanto tivermos problemas em nossas cidades. E como os conflitos são os lubrificantes das cidades, é fundamental a presença deles que tem muitas habilidades, são um pouco psicólogos, diplomatas e políticos. Porque o arquiteto tem que ser o grande negociador do futuro das cidades. É preciso ensinar o mercado imobiliário que a Arquitetura cria valor e que Urbanismo é qualidade de vida. Temos que repetir isso mais e mais, não pensar em fazer obras sem projeto”.
NOVAS FERRAMENTAS – Entre todas as novas ferramentas disponíveis para os arquitetos e urbanistas, o BIM (Building Information Modeling) é a que já se consolidou como uma nova plataforma. “Não é um modismo”, engenheiro civil Wilton Catelani, coordenador da Comissão de Estudo Especial da ABNT sobre a primeira norma brasileira para o BIM, outro palestrante do seminário.
Segundo ele, a grande vantagem do BIM é mesclar e compatibilizar os elementos de Arquitetura, Engenharia e projetos complementares. Ao mesmo tempo em que isso facilita a visualização pelo cliente do produto final, o sistema permite ao profissional acesso a informações que serão importantes para a conclusão do projeto para as obras.
A professora Isabel Amália Medero Rocha, da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), discorreu sobre a transição da “fabricação” analógica da Arquitetura para a “fabricação digital”, que exige conhecimentos de computação, matemática e lógica.
A gestão da informação de uma edificação não se esgota, contudo, com sua construção com utilização do BIM, segundo o arquiteto e urbanista David Douek. Ele falou sobre o Real Estate 4.0, um conceito que reúne ainda a gestão de ativos, o uso de “big data analytics” e da “internet das coisas” com o objetivo de análise e melhoria contínua do patrimônio. Em um hospital, por exemplo, os indicadores a serem monitorados são a interoperabilidade dos sistemas, a mobilidade dos equipamentos, a digitalização da informação, a unificação da comunicação e a automação dos sistemas.
Na área do planejamento urbano igualmente existem novos sistemas de suporte à decisão, como modelos, indicadores e sistemas de informação georreferenciada, como demonstrou a professora Ana Paula Zechlinski, professora da Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Esses sistemas permitem compreender melhor o processo dinâmico de transformação da cidade no espaço e no tempo.
“Estamos vendo o nascimento de um novo paradigma do planejamento urbano. O tradicional era estático, normativo e seguia uma estrutura hierárquica decisão. O novo paradigma é um planejamento dinâmico, constante, com múltiplos agentes e facilidade de adaptações às mudanças”.
As ferramentas são ao mesmo tempo analíticas e interativas, diz Ana Paula. Analíticas por permitirem a regulagem de critérios para melhor entender e visualizar cenários futuros. E interativas porque podem ser disponibilizadas para a população em geral, permitindo que a participação popular conte com a mesma base de informação das equipes técnicas. “São ferramentas que podem auxiliar em todas as etapas na elaboração dos planos urbanos e na avaliação sobre a inserção de novos projetos no ambiente pré-existente”.
Mauricio Matias, sócio da Rede Brasileira de Fabricação Digital, apresentou pesquisa para construções habitacionais que substituiria a alvenaria convencional por blocos por encaixe fabricados com uso de impressoras 3D. As pesquisas indicam uma considerável – não especificada – diminuição de custos, levando em consideração a soma de todo o processo, como o custo de transporte do material, mão de obra, acabamento e tempo de execução. A utilização do sistema, contudo, requer mão de obra qualificada, o que hoje é escasso no país.
Clique nos links abaixo para acessar as apresentações:
Apresentação Wilton Catelani, coordenador da Comissão de Estudo Especial da ABNT.
Apresentação Isabel Amália Medero Rocha, professora da Universidade Federal da Paraíba (UFPB).
Apresentação Arquiteto e Urbanista David Douek
Apresentação Ana Paula Zechlinski, professora da Universidade Federal de Pelotas (UFPel).
Apresentação Mauricio Matias, sócio da Rede Brasileira de Fabricação Digital.
Apresentação Mauricio Matias, sócio da Rede Brasileira de Fabricação Digital – Monografia.
Publicado em 01/11/2016.