Três painéis em sequência iniciaram a programação da Semana da Habitação 2023, que acontece em Aracaju/SE entre 26 e 20 de julho.
O primeiro contou com a participação do Coordenador da Área de Habitação e Saneamento da Fundação João Pinheiro (FJP), Frederico Poley, que apresentou dados atualizados sobre o “Déficit Habitacional e Inadequação de moradias no Brasil e a ATHIS. Poley é responsável pelo desenvolvimento e cálculo do Déficit Habitacional no Brasil dentro da FJP, que desde 1995 sistematiza dados que servem de subsídio para políticas habitacionais no Brasil.

A partir de dados recém divulgados pelo Censo 2022, Poley apontou um contraste entre o crescimento populacional e o volume domiciliar no Brasil. Enquanto a população registrada ficou em 203 milhões, ao invés de 214 milhões projetados, o número de domicílios aumentou de 67 milhões para 90.688.021. Outro dado significativo para composição do cenário é o crescimento de domicílios vagos, que passaram de 6.097.778 em 2010 para 11.397.889 em 2022. 23 milhões de domicílios apresentaram ao menos um tipo de inadequação (infraestrutura e edilícia), segundo o técnico da FJP.
Diante de um cenário de redução de moradores por residência, os dados apontam para um novo paradigma a ser considerado por programas habitacionais, com mais foco em melhorias habitacionais para além da produção das novas unidades. “Estes dados fundamentam a mudança da lógica da produção da habitação”, comentou a presidente Nadia Somekh.
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O segundo painel foi dedicado a compor uma linha do tempo da ATHIS no Brasil. A presidente nacional do IAB, Maria Elisa Baptista, fez um resgate histórico dos principais capítulos da história da participação dos arquitetos e urbanistas na construção da política educacional brasileira. Maria Elisa lembrou os 60 anos do Seminário Nacional de Habitação e Reforma Urbana realizado no Hotel Quitandinha, em Petrópolis/RJ, um marco da política urbana e habitacional e que contribuiu com a formulação nos capítulos 182 e 183 da constituição de 1988, que tratam da política de desenvolvimento urbano.

Também recordou a aprovação do Estatuto da Cidade, em 2001; e a sanção da lei 11.888/2008, a partir do projeto apresentado na Câmara Federal por Clovis Ilgenfritz e conduzido, na sequência, por Zezéu Ribeiro, ambos arquitetos e urbanistas. “Este texto merece ser estudado e utilizado, pois guarda os critérios, os modos e as possibilidades de nosso ofício cumprir seu ideal de servir à sociedade brasileira no que ela mais precisa: moradia digna e cidades generosas e equitativas”, afirmou.
Procurando complementar os números apresentados para a composição do diagnóstico habitacional proporcionado pela Semana da Habitação 2023, a vice-presidente Daniela Sarmento adicionou dados viabilizados pela pesquisa CAU/Datafolha realizada em 2022. Segundo o estudo, 82% das construções são feitas sem a assistência técnica de arquitetos, urbanistas ou engenheiros e 60% das habitações precárias no Brasil são chefiadas por mulheres.
Em sua apresentação, Daniela Sarmento reconstituiu o histórico da estruturação de uma política de ATHIS integrada a partir do do Conselho de Arquitetura e Urbanismo. Criado cinco anos após a vigência da Lei, o CAU tem catalisado esforços pela aplicação da Lei. Em 2015, a autarquia lançou o primeiro edital voltado a financiar iniciativas que pudessem materializar exemplos da efetividade da lei da ATHIS. No ano seguinte, com a aplicação do orçamento mínimo de 2% da receita líquida em ações voltadas ao fortalecimento da ATHIS, o Conselho passou a investir financeiramente de forma constante. Desde então, foram aplicados R$ 23.344.715,47 em iniciativas focadas em melhorias habitacionais, estudos e outras ações.
Apenas na atual gestão, entre 2021 e 2023, o CAU promoveu diversas ações para fortalecimento da rede de ATHIS no Brasil, como parcerias institucionais e as próprias Semanas da Habitação (2021, 2022 e 2023). Também realizou campanhas de comunicação para divulgar a ATHIS em âmbito nacional e criou o Portal Moradia Digna (caubr.gov.br/moradiadigna). Procurando alavancar recursos para ampliar as experiências de ATHIS, conquistou orçamento proveniente de emendas parlamentares e esteve presente na Marcha Nacional dos Prefeitos deste ano.
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No próximo período, segundo Daniela, os desafios são a implantação do Fundo de ATHIS, processo já iniciado a partir da parceria com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). A iniciativa foi relatada pelos técnicos do IPEA, Cleandro Krause e Renato Balbim, no terceiro painel da manhã, intitulado Estruturação programática da ATHIS a partir do CAU.
O estudo vem sendo desenvolvido para oferecer subsídios para uma estratégia que possa oferecer escala a programas de melhorias habitacionais com base em ATHIS no Brasil. No painel, Balbim e Krause apresentaram os resultados da primeira etapa da pesquisa e o atual estágio da segunda etapa.
O IPEA utilizou dados reportados pelos CAU/UF sobre as ações de ATHIS desenvolvidas até o momento para aferir seu impacto nas realidades territoriais. No total, foram identificadas 154 ações.
A pesquisa foi desenvolvida a partir da metodologia do modelo lógico que estrutura, a partir do problema central um infográfico-árvore, apontando as causas e consequências. Também usou amostras de dados disponibilizados pela Companhia de Desenvolvimento Habitacional do Distrito Federal (CODHAB) e do Instrumento de Diagnóstico Habitacional de Maringá, no Paraná.
Conforme dados tabulados pelo IPEA com base no CadÚnico (2019) do Governo Federal, há 13 milhões de famílias com demandas que poderiam ser acolhidas por políticas de melhorias habitacionais. O número equivale a 46,42% do total de unidades familiares cadastradas no banco de dados do governo federal. Tomando como base os valores dos kits do Programa de Regularização Fundiária e Melhoria Habitacional (REG MEL), gerido pelo Ministério das Cidades, seriam necessários R$ 193 bilhões para erradicar as precariedades e inadequações de moradia deste universo populacional. O volume financeiro é menor do que o investido pelo Governo Federal em dez anos e beneficiaria mais que o dobro das famílias: entre 2009 e 2019, o MCMV construiu 5 milhões de novas habitações com o subsídio de R$ 218 bilhões.
Entre os aprendizados assimilados até o momento, Balbim mencionou o reconhecimento da efetividade de experiências existentes e da economia da autoprodução. “15 anos da lei da ATHIS é um marco. Estamos no percurso da produção social de moradia. Queremos dar um salto com a política de Melhorias Habitacionais e dialogar com economia da autoprodução habitacional que nunca foi uma política efetiva no país”, afirmou Balbim. “Estamos trazendo a novidade da economia submersa não reconhecida, não explícita. Isso vai nos permitir mostrar como a casa e a cidade tem a ver com a saúde da população”, afirmou a presidente Nadia Somekh.
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Os resultados preliminares do estudo estão disponíveis no repositório do IPEA (ACESSE AQUI). Outras duas notas técnicas estão em produção pela equipe. A primeira vai apontar elementos para estruturação de um programa nacional de melhorias habitacionais. A segunda, estabelecerá as convergências entre políticas de melhorias habitacionais e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS/ONU).
Os dados foram desdobrados na oficina Cenários de captação e ampliação de Recursos para ATHIS e REURB, realizada na tarde do dia 26 de julho.