A primeira mesa-redonda do III Seminário Legislativo de Arquitetura e Urbanismo abordou duas leis que pretendem organizar o desenvolvimento urbano: o Estatuto da Cidade, aprovado em 2001, e o Estatuto da Metrópole, sancionado em 2015. Segundo o pesquisador Nelson Saule Júnior, coordenador-geral do Instituto Pólis, a Constituição Federal de 1988 já prevê o reconhecimento de direitos à condição de vida urbana e digna, como saneamento, iluminação pública e preservação do patrimônio cultural e ambiental. Mas ainda hoje a sociedade ainda enfrenta o debate sobre como materializar esses direitos.
“A questão que se coloca como um dos problemas do Estatuto das Cidades é que não fica claro se é obrigatório estabelecer áreas que não cumprem sua função social, justamente áreas que são objeto de especulação imobiliária”, disse. “Verifica-se que a maioria dos municípios não definiu áreas para a reforma urbana e não definiu os instrumentos para sua aplicação. Continua sendo algo discricionário do poder público aplicar ou não esses instrumentos”.
Nelson diz também que em 1988 a ideia de cidade era relacionada à realidade das metrópoles, o que se refletiu no Estatuto da Cidade. “Mas o Brasil tem mais de 4 mil municípios com 20 a 40 mil habitantes, alguns com territórios maiores que países europeus. Temo que agora a concentração de esforços na implementação do Estatuto da Metrópole se acentue. Temos que pensar em formas de resolver o problema do ordenamento e planejamento da maioria das cidades brasileiras. Por isso, defendo a criação do Sistema Nacional de Desenvolvimento Urbano. E nisso o papel da União é fundamental”, afirmou.
O deputado Edmílson Rodrigues (PSOL-PA) acredita que falta no Estatuto da Cidade artigos que tratem de forma mais clara das questões de saneamento e irrigação urbana. Ele também critica o pouco incentivo à participação popular nos planos diretores. “Nós não podemos acreditar que um plano vai dar certo sem transparência, participação, democracia. Quando fazemos um projeto para um empresário, ele é meu cliente, tenho que atender sua necessidade. Mas muitas vezes o cidadão não é visto assim na construção dos planos diretores”.
Para o deputado Júlio Lopes (PP-RJ), esse debate tem relação direta com outro, sobre a Lei Geral de Licitações. Ele propôs que todas as obras públicas acima de R$ 7 milhões só sejam licitadas a partir de projetos feitos com tecnologia BIM (Building Information Modeling – Modelagem de Informações da Construção), que possibilita ao arquiteto criar digitalmente modelos virtuais que abrangem todas as etapas da construção. Quando concluídos, esses modelos gerados por computador contêm geometria e dados precisos, permitindo melhor análise e controle. “Já é assim em mais de 80 países. Eu quero ser o advogado do BIM aqui na Câmara”, disse o parlamentar.
Para a conselheira federal Lana Jubé Ribeiro, uma das grandes preocupações da Comissão de Política Urbana e Ambiental do CAU/BR, que ela coordena, é a proliferação de propostas legislativas de alterações do Estatuto da Cidade, que podem desfigurá-lo ou inchá-lo a ponto de torná-lo ineficaz.
O presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), Sérgio Magalhães, destaca que um dos principais problemas é que os planos carecem de desenho, de especificações visuais e especializadas que permitam sua compreensão por parte da sociedade como um todo, em contraponto ao uso de índices e coeficientes abstratos de uso e ocupação do solo, como é feito hoje. “Quando nos abstemos de projetos espacializados, desenhados, nós estamos transferindo à propriedade privada a definição da forma urbana, do espaço público”, afirmou.
Para ele, a expansão das cidades precisa ser contida ao invés de estimulada. “Isso acontece não-investimento em transporte público, pela dissociação entre habitação, lazer e trabalho, pela construção de conjuntos para o Minha Casa Minha Vida longe dos centros urbanos. Não vamos longe com esse tipo de decisão, que é arbitrário. Os prefeitos são discricionários porque faltam projetos”.
Publicado em 10/07/2015. Atualizado em 13/07/2015.